Ubuntu – inovação social e construção de pontes
O Instituto. P. António Vieira, em diálogo com a Fundação Gulbenkian, desenvolveu uma abordagem de educação não-formal, inspirada neste conceito Ubuntu, que se foi consolidando.
Os tempos turbulentos que vivemos mostram a urgência de uma cultura de construção de pontes, da ética do cuidado (que valorize o cuidar de si, dos outros e do planeta), bem como da afirmação de um novo estilo de liderança servidora. Os desafios da complexidade, associados à ascensão dos populismos e à explosão da polarização social, exigem que as novas gerações possam ser protagonistas deste novo ciclo. Para o inspirar, entre vários exemplos, África deu ao mundo a filosofia Ubuntu. Esta visão humanista de interdependência e complementaridade, na qual “a minha humanidade só se completa com a do outro”, descodificada na expressão “uma pessoa só pode ser pessoa através das outras pessoas”, representa uma chave para o século XXI. “Relaciono-me, logo existo” atualiza o pensamento cartesiano, que nos mobiliza para os passos a dar, na busca de uma unidade na diversidade na qual ninguém fique para trás.
Em Portugal, na última década, a partir deste conceito, criou-se e sistematizou-se uma metodologia para tornar possível esta “revolução” pacífica. O Instituto. P. António Vieira, em diálogo com a Fundação Gulbenkian, desenvolveu uma abordagem de educação não-formal, inspirada neste conceito Ubuntu, que se foi consolidando. Apostando no trabalho em torno de cinco pilares essenciais para o desenvolvimento sócio-emocional como o autoconhecimento, a autoconfiança, a resiliência, a empatia e o serviço - capacitaram-se jovens e formaram-se educadores, mobilizaram-se escolas e organizações juvenis e este roteiro de transformação pessoal e comunitária foi fazendo caminho.
Na inovação social, coloca-se sempre o grande desafio de como passar de uma boa ideia a um projeto sustentável e, daí, a um impacto sistémico através da sua transformação em políticas públicas. Não raras vezes, bons projetos ficam pelo caminho ou não dão o fruto ambicionado. No caso da Academia Ubuntu, foi possível percorrer esse ciclo bem-sucedido, do protótipo até ao impacto sistémico e à internacionalização graças à conjugação de uma visão estratégica ambiciosa e inovadora, uma abordagem de longo prazo, uma equipa com forte compromisso e – fundamental – da mobilização consistente de apoios públicos e privados, entre os quais a Fundação Gulbenkian se destaca, desde o primeiro momento.
Celebramos o 10.º aniversário desta caminhada com a realização do “Ubuntu United Nations” que, em outubro, envolverá delegações de 190 países de todo o mundo. Estes jovens celebrarão o espírito de unidade na diversidade, enquanto verdadeiros pontífices, sendo acompanhados por quatro laureados com o Nobel da Paz (Muhammad Yunus, Kaylash Satyarti, Laymah Gbowee e Ramos Horta, que preside ao evento) e contando com as palavras de inspiração do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Pela primeira vez, teremos uma Academia de Líderes Ubuntu digital, à escala planetária, com o apoio da Fundação Gulbenkian e do programa Erasmus.
Porém, como Mandela refere no último parágrafo da sua autobiografia Um longo caminho para a liberdade, depois de escalar altas montanhas, verificamos que outras mais altas se perfilam. Temos ainda muito a aprender e melhorar. Temos pela frente vários desafios, como prosseguir a partilha desta metodologia com os sistemas educativos de todo o mundo, alargar a sua disponibilização em várias línguas (ao português, inglês, espanhol e francês, seguir-se-á o árabe), consolidar os formatos digitais que tornem acessível a Academia de Líderes Ubuntu para todo o mundo ou a extensão da metodologia, em Portugal, ao sistema de acolhimento de crianças e jovens. Seguiremos juntos nesse caminho, afirmando a capacidade de inovação social nacional, ao serviço da Humanidade.