A corrida ao lítio no Norte e no centro de Portugal
Áreas requeridas, atribuídas e em vias de atribuição para prospecção ou exploração de lítio entre Junho de 2016 e Janeiro de 2020
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Legenda
Rede Natura 2000
Requerimento de prospecção e pesquisa
Contrato para prospecção e pesquisa
Requerimento de exploração
Contrato para concessão de exploração
Concurso público
Movimentos contestatários
Em Janeiro de 2020, 14 associações cívicas e ambientalistas assinaram um manifesto nacional contra o plano de mineração em Portugal: Associação Montalegre com Vida, Associação Unidos em Defesa de Covas do Barroso, Corema – Movimento de Defesa do Ambiente e Património do Alto Minho, Em Defesa da Serra da Peneda e do Soajo, Guardiões da Serra da Estrela, Movimento contra a Exploração de Recursos Minerais no Concelho de Montalegre, Movimento ContraMineração Beira Serra, Movimento ContraMineração Penalva do Castelo, Mangualde e Sátão, Movimento de Cidadãos por Uma Estrela Viva, Movimento SOS Serra d'Arga, Movimento Lisboa contra as Minas, Petição pela Preservação da Serra da Argemela, PNB – Povo e Natureza do Barroso e SOS Terras do Cávado. Estas plataformas mobilizam milhares de habitantes do Norte e do centro do país. Destacamos quatro das mais ativas.
Com o crescimento do preço do lítio em 2015 e 2016, os pedidos de prospecção e pesquisa de lítio em Portugal chegaram aos 22 num só ano. Em 2019, esse registo foi igualado, com a empresa australiana Fortescue a ser responsável pela totalidade dos requerimentos. Desde então, deixou de haver pedidos de prospecção: por causa da pandemia, do atraso na resposta aos pedidos anteriores e da espera pela realização do concurso público.
Pedidos de prospecção de lítio
As empresas na corrida ao lítio
As ferramentas de uma mineração mais “verde”
A União Europeia pretende que as minas do futuro sejam mais tecnológicas, mais eficientes e menos nocivas para o meio ambiente. Nesse sentido, têm sido introduzidas tecnologias de engenharia, bem como aplicações de inteligência artificial, Internet das Coisas e de Big Data. Produtividade, segurança, transparência, performance ambiental e apoio das comunidades locais são os objectivos a atingir pelas minas 4.0
Os impactes ambientais e o que é possível fazer para os evitar
O caso da Mina do Barroso
O estudo de impacte ambiental (EIA) da Savannah para a Mina do Barroso propõe potenciais soluções para os danos que, inevitavelmente, uma mina a céu aberto inflige ao meio ambiente. Contudo, os barrosões duvidam da eficácia de muitas das tecnologias propostas.
Interactivo
Escombreiras
Risco: A população teme eventuais falhas do sistema de contenção de resíduos, nomeadamente em períodos de pluviosidade elevada que possam causar derrocadas e acidentes ambientais graves. Desconfiam também da designação “rejeitados secos” feita pela Savannah, que afirma que os resíduos terão apenas 15% de água (quanto mais água nos rejeitados, maior o risco de derrocada).
Solução proposta: Os estudos geotécnicos do EIA mostram que um deslizamento de rejeitados secos empilhados é virtualmente impossível. No caso de ruptura da escombreira, a Savannah diz ter concebido o projecto de forma a que os danos fiquem contidos dentro da mina, não afectando os rios. Diz ainda que investirá numa série de filtros de rejeitados para retirar a água, de modo a garantir que os rejeitados atinjam os níveis de humidade requeridos para a sua depositação na escombreira. Será a primeira mina de lítio a usar rejeitados secos empilhados.
Solo
Risco: Existe receio de contaminação dos solos. A população quer saber mais sobre a radioactividade natural das rochas da região. Além disso, a população desconfia da estratégia de recuperação ambiental da Savannah, alegando que a camada fértil do solo será removida e que o buraco será tapado com terra estéril. Dizem também que nenhuma árvore crescerá ali em menos de 12 anos após a recuperação ambiental.
Solução proposta: Foi feita colheita de solos (26 amostras) que serão comparadas com outros já com a mina em operação, mas a Savannah não prevê impactes. Diz ainda que a radioactividade natural das rochas é tão baixa que estas têm sido usadas para construir casas há centenas de anos, sem problemas de saúde conhecidos. Assegura uma reabilitação progressiva e contínua desde o primeiro dia de trabalho. O solo superficial será removido antes da mineração para garantir que é armazenado de uma maneira viável, de forma a ser usado na reabilitação.
Água
Risco: Os locais afirmam que o desvio de linhas de água vai afectar o regadio tradicional, por existirem várias áreas de cultivo e lameiros a jusante de linhas de água afectadas e que dependem destas para a rega. Também temem o uso excessivo de água por parte da mina e a redução do caudal do rio Covas abaixo do seu limite ecológico.
Solução proposta: No caso de escassez de água nos lameiros, a empresa compromete-se a providenciar a água em falta. Diz também que não extrairá água do rio Covas que afecte o caudal ecológico, tendo como salvaguarda um programa de monitorização do rio. Confirma que haverá linhas de água desviadas por canais mas que, após o encerramento da mina, esses canais serão eliminados fazendo com que a água entre nas cortas (áreas de exploração). Os canais de desvio que contornam as escombreiras permanecerão. O EIA não prevê transtornos no abastecimento de água às populações por as cortas e o desvio dos cursos de água ocorrem a jusante das localidades.
Fauna
Risco: Biólogos temem que espécies como a toupeira-de-água possam vir a ser muito afectadas caso exista diminuição do caudal ecológico do rio Covas e contaminação por escorrências. Também o lobo-ibérico poderá ver afectado o seu corredor ecológico que liga o Parque Natural do Alvão e o Parque Nacional da Peneda-Gerês, com a mina no meio.
Solução proposta: O EIA confirma que a área da mina é um local de passagem de alcateias e que poderá haver um impacto mínimo no lobo, mas que no final os lobos voltarão à zona. Quanto às espécies aquáticas, o estudo propõe um plano direccionado à monitorização da qualidade da água e outro direccionado à toupeira-de-água e ao mexilhão-do-rio, a quem a Savannah diz poder tirar um máximo de 1% de água do caudal.
Explosivos
Risco: As detonações a realizar a cada dois dias podem provocar ruídos incómodos para a população e abalos que causem danos na estrutura das casas.
Solução proposta: Os estudos periciais do EIA concluíram que a detonação não causará nenhum problema aos residentes e que os limites legais serão cumpridos. Quanto às vibrações, a Savannah indica que as estruturas sensíveis só poderão ser afectadas com vibrações superiores a 6mm/s, o que só ocorre a distâncias inferiores a 215 metros, e que todas as habitações estão mais afastadas.
Ar
Risco: Covas do Barroso receia a libertação de poeiras sobre a povoação e sobre os terrenos agrícolas. Reclama também respostas sobre a metodologia para a avaliação de impactes na qualidade do ar, nomeadamente sobre o regime de ventos na zona e sobre a disponibilidade dos dados da simulação de dispersão de partículas. Subsistem também dúvidas sobre as emissões de dióxido de carbono para a atmosfera.
Solução proposta: Monitorização contínua de poeiras com pontos de controlo em todas as aldeias vizinhas e sistemas de aspersão de água nas estradas de terra para minimizar a geração de pó, mantendo o chão sempre húmido. A empresa diz ter analisado o regime de ventos na zona e que não detectou na qualidade do ar quaisquer riscos para a saúde.
Mina em Portugal será a mais poluente
Nos últimos anos, a indústria do lítio tem sido acusada de excesso de uso de água, de contaminações químicas de ecossistemas locais e de más relações com as populações próximas das minas. Agora, há uma nova preocupação: com a procura em enorme crescendo até 2030, estima-se que as emissões de dióxido de carbono também vão aumentar. Segundo a Roskill – um órgão de referência na análise de matérias-primas –, as emissões de CO2 na produção de lítio vão triplicar até 2025 e multiplicar-se por seis até 2030.
A maioria do dióxido de carbono advém da produção do concentrado de lítio, do transporte marítimo e da refinação. Há uma clara diferença entre a produção a partir de salmouras e de minas: em média, o lítio extraído das rochas, essencialmente espodumena, precisa de 9 toneladas de CO2 por tonelada de carbonato de lítio produzido, o triplo do registado numa exploração em salmoura.
Os dois factores que mais contribuem para este resultado são as elevadas emissões registadas no transporte do concentrado de lítio para refinação na China, realizado através de uma navegação marítima poluente. Acresce as pesadas emissões da refinação na China, que usa o carvão como principal fonte de energia das suas fábricas.
Há, portanto, muito trabalho a fazer para que uma indústria que encontrou o seu fundamento na descarbonização não contribua para o problema, em vez de o resolver. É essa uma das razões para a UE ambicionar trazer toda a cadeia de valor para o seu domínio, evitando a poluição do transporte e da refinação na Ásia.
No entanto, muito dificilmente haverá uma refinaria na Europa antes de 2025. Portanto, qualquer mina que arranque em Portugal antes dessa data terá de exportar o concentrado de lítio para Pequim. Com base nessa possibilidade, uma análise realizada pelos norte-americanos Alex Grant, da Jade Cove Partners, e David Deak, da Marbex, e pelo inglês Robert Pell, da Minviro, publicada em Janeiro de 2020, chegou à conclusão de que a Mina do Barroso, em Covas do Barroso, poderá vir a tornar-se a mina de lítio mais poluente do mundo, com uma emissão de 15t de Co2 por cada tonelada de hidróxido de lítio produzida.
Lítio do Barroso vai ter forte pegada ecológica, se refinado na China
Intensidade de CO2 (tonelada de CO2/tonelada de hidróxido de lítio)
Carros eléctricos vs carros a gasolina/gasóleo
Um estudo publicado em 2020 pela Federação Europeia de Transportes e Ambiente (FETA), considerado pela Zero como o mais fiável realizado até hoje, concluiu que um automóvel eléctrico médio na UE já apresenta três vezes menor impacte de emissões de dióxido de carbono do que um carro convencional equivalente a gasóleo ou a gasolina.
Os carros eléctricos ficarão mais limpos à medida que a economia da UE se descarbonizar: em 2030, espera-se que sejam quatro vezes menos poluentes do que os convencionais.
Uma condução com menos carbono
Toneladas de CO2 emitidas no ciclo de vida, em gCO2/km
Conduzindo em Portugal (combustível/produção de electricidade e consumo)
Produção do carro na UE (excluindo a bateria)
Produção da bateria na UE (baixo carbono)
Emissões de CO2 em 2030
A análise incide sobre o ciclo de vida dos veículos – uma estimativa das emissões totais de CO2 associadas à extracção de matérias-primas, construção e operação dos carros, bateria e consumo de electricidade com o carregamento. O dióxido de carbono é um poluente particularmente relevante como gás de efeito de estufa que contribui para o aquecimento global e consequentes alterações climáticas.
Considerando um modelo automóvel de média capacidade, com uma vida útil na ordem dos 225.000 quilómetros, as emissões médias associadas à produção e distribuição de electricidade em Portugal e a produção da bateria na Europa num país com electricidade produzida com emissões de carbono reduzidas, um automóvel eléctrico emitirá menos 66% de dióxido de carbono do que um automóvel a gasóleo e menos 68% do que um automóvel a gasolina no seu ciclo de vida.
Em Portugal, as emissões totais de um veículo eléctrico seriam de 18,1 toneladas de CO2 (6 toneladas associadas à produção do automóvel, 3,6 da produção da bateria e 8,5 na condução). No caso de um automóvel a gasóleo, verificar-se-iam 52,5 toneladas totais de emissão (7 na produção e 45,5 na condução). Para um veículo a gasolina, o total é de 57 toneladas (6,7 na produção e 50,3 na condução).
No melhor cenário, os carros eléctricos da UE emitem menos 66% de CO2 do que os a gasóleo e menos 68% do que os a gasolina
Toneladas de CO2 emitidas no ciclo de vida, em gCO2/km
Conduzindo em Portugal (combustível/produção de electricidade e consumo)
Produção do carro na UE (excluindo a bateria)
Produção da bateria na UE (baixo carbono)
Há provas de que os carros eléctricos – alimentados com electricidade com emissões médias da UE – pagam a sua “dívida de carbono” da produção da bateria após pouco mais de um ano e economizam mais de 30 toneladas de CO2 durante a sua vida útil em comparação com um automóvel equivalente convencional. Os veículos eléctricos que fazem uma quilometragem elevada (veículos partilhados, táxis ou serviços semelhantes ao Uber) economizam até 85 toneladas ao longo da sua vida útil (em comparação com os veículos a gasóleo).
O número total de veículos eléctricos nas estradas vai aumentar 30 vezes na Europa até 2030. Isso significa que 97% dos carros eléctricos que estarão nas ruas em 2030 ainda não foram vendidos (de 1,3 milhões de veículos eléctricos no final de 2019 passaremos para 44 milhões em 2030).