Erasmus + Inclusivo
Em Portugal, o único apoio disponibilizado pelo Estado aos estudantes que concorrem ao programa Erasmus, é um complemento mensal de 100€, ou de 150€, limitado aos beneficiários de bolsa de ação social
O programa Erasmus+ tem sido um dos pilares principais de afirmação da identidade europeia, contribuindo de forma positiva e bem-sucedida para o processo de integração europeu. Desde a sua criação, há 34 anos, já beneficiaram de oportunidades de mobilidade mais de 1 milhão de europeus.
Eu faço parte desse número. Fiz um semestre de mobilidade na University of Economics, na República Checa. Foi com o programa Erasmus que aprendi e percebi a dimensão da nossa nacionalidade e que hoje digo que sou portuguesa e europeia, e que não sei ser uma sem a outra. Por fazer parte desta geração, senti um grande entusiasmo e regozijo ao votar favoravelmente no Parlamento Europeu um orçamento que duplica os recursos disponíveis para o programa.
Mas o Erasmus é bem mais do que um programa de intercâmbio. Se em 2014 o programa foi transformado em Erasmus+, com uma aposta forte no apoio a iniciativas nas áreas da cultura, desporto e juventude, em 2021 a prioridade terá de passar por integrar este programa nos objetivos estabelecidos pela União Europeia (UE) para a transição digital e ação climática. Estes dois objetivos estão vincados na estratégia de recuperação da economia europeia para o pós-pandemia. No entanto, subjacente a esta estratégia, está a premissa de não deixar ninguém para trás e, por esse motivo, o programa Erasmus+ também terá de se tornar mais inclusivo.
Quando em 2017 se celebraram os 30 anos do programa, a Agência Erasmus+ apresentou um estudo que demonstrava que apena 1 em cada 3 estudantes era oriundo de contextos sociais desfavorecidos e que a possibilidade de desemprego de longa duração diminui cerca de 50% entre os estudantes que beneficiaram de uma oportunidade de mobilidade. Antes da pandemia, cerca de 4% dos estudantes europeus faziam mobilidade Erasmus, mas em Portugal a percentagem não ultrapassava os 2%. Em abril, o Governo português, pela voz do ministro Manuel Heitor anunciou que o objetivo nacional passa por triplicar o número de estudantes portugueses envolvidos no programa e fixou a meta em 30 mil estudantes por ano até 2027.
É fundamental passar das palavras aos atos e, até ao momento, desconhecem-se medidas concretas que permitam concretizar esse objetivo. Em Portugal, o único apoio disponibilizado pelo Estado aos estudantes que concorrem ao programa Erasmus, é um complemento mensal de 100€, ou de 150€, limitado aos beneficiários de bolsa de ação social. O único critério observado é o valor de bolsa atribuído, não sendo considerado de forma alguma o custo de vida do país de destino do estudante.
No entanto, o problema transcende o universo de beneficiários da bolsa de ação social. Um estudante cujos pais recebam um salário mensal na ordem dos mil euros, muito provavelmente não será sequer elegível para beneficiar da bolsa de estudo e, ainda que consiga frequentar o Ensino Superior, muito provavelmente não terá facilidade em considerar um período de mobilidade numa instituição de ensino estrangeira.
Não será por acaso que Portugal recebe muito mais estudantes, do que aqueles que envia para outros países europeus, nem que a maioria escolha destinos com custos de vida económicos. Assim, promover o aumento do número de estudantes portugueses em mobilidade internacional implica que o Governo vá para além do anúncio de metas e das ações de propaganda mediática que normalmente adornam essas cerimónias. São necessários apoios concretos que complementem as bolsas de mobilidade diretamente atribuídas pela UE.