Estima-se que trabalhem actualmente nas regiões do Algarve e do Alentejo cerca de 30 mil trabalhadores agrícolas imigrantes. Deste valor, sabe-se que 12 mil trabalham em Beja, segundo dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Na diferença entre os valores oficiais e os estimados, sabe-se, ainda, que muitos deles escapam à realidade burocrática pois correspondem a chegadas ilegais e clandestinas ao país. Estes números revelam a crescente dependência do sector agrícola português na força laboral dos imigrantes. Situação que concorre, aliás, com os restantes países da União Europeia.
Mas o que têm estes trabalhadores agrícolas imigrantes a ver com as alterações climáticas? Bom, para o entender é necessário começar pelas condições laborais que estes trabalhadores do sector agrícola português enfrentam.
Segundo declarações de José Alberto Guerreiro, presidente da Câmara Municipal de Odemira, em Março de 2020, este concelho da costa alentejana alberga cerca de 10 mil trabalhadores agrícolas, muitos deles a viver “em habitações precárias e sem as mínimas condições de higiene”. Quatro meses antes, a 24 de Outubro de 2019, era publicada uma Resolução do Conselho de Ministros, na qual se identificava a existência de um complexo habitacional para trabalhadores agrícolas constituído por “270 alojamentos precários nas explorações agrícolas situadas dentro do Aproveitamento Hidroagrícola do Mira [AHM]” em Odemira.
Face a esta situação de precariedade habitacional, o Conselho de Ministros estabeleceu um regime especial e transitório aplicável ao AHM com a duração de dez anos durante o qual será criado um projecto cuja missão será de acomodar em perímetros urbanos estes trabalhadores agrícolas. A situação em Odemira é acompanhada por um crescente número de denúncias de Organizações da Sociedade Civil (OSC), entre as quais a Solidariedade Imigrante, que expõem situações de abusos e exploração laboral a trabalhadores imigrantes nos campos agrícolas do Alentejo e do Algarve.
A exploração abusiva no sector agrícola não se verifica apenas na relação entre o proprietário e o trabalhador, mas também no uso que o proprietário faz do solo. Globalmente, o sector agroalimentar é responsável por um quarto do total da emissão de gases com efeito de estufa no mundo. O modelo de produção intensiva a abusiva sustenta-se numa cadeia de produção onde o trabalhador agrícola vive em condições precárias e o proprietário agrícola é refém das leis impostas pelos compradores do grande retalho.
Para colmatar este fenómeno, a Organização Mundial do Trabalho (ILO) e a Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO) apontam para a necessidade de adoptar modelos de produção agrícola sustentável e convidam os sindicatos e as OSC a tomar um papel mais preponderante nesta missão. Exemplos de associações como a Solidariedade Imigrante ou campanhas como a Our Food. Our Future requerem o nosso reconhecimento pelo esforço que fazem em dignificar todos e todas aqueles que trabalham nos campos agrícolas e elevam o seu potencial de tornar o mundo agrícola mais sustentável.