Lei Eleitoral: uma proibição inaceitável
A lei tal como está tem o claro efeito de dificultar, no que toca aos municípios, uma mais ampla participação democrática dos cidadãos na vida autárquica local, o que não é aceitável.
Foi publicada em Agosto de 2020 uma alteração à lei eleitoral das autarquias locais que proíbe os cidadãos de se candidatarem simultaneamente à câmara municipal e à assembleia municipal de um município.
Antes desta alteração, os pequenos partidos e os grupos de cidadãos emergentes tinham a possibilidade de colocarem aqueles que consideravam os seus nomes mais representativos na lista para a câmara e na lista para a assembleia e, assim, se eles não entrassem como vereadores na câmara, o que sucedia muito frequentemente, tinham sempre a possibilidade de ter um lugar na assembleia municipal desde que obtivessem um número suficiente de votos, aplicando-se o método d’Hondt.
Com a alteração agora introduzida, os pequenos partidos e grupos de cidadãos têm de enfrentar problemas sérios se quiserem concorrer, como é natural, à câmara e à assembleia municipal. Na verdade, se colocarem os seus melhores nomes na lista da câmara, estes correm o risco de não serem eleitos por não terem o número de votos suficientes e, porque não puderam concorrer à assembleia municipal, ficarem também fora deste órgão.
Se, em vez disso, colocarem os seus melhores nomes na lista da assembleia municipal confessam, antes da eleição, a convicção da impossibilidade de eleger membros para a câmara, o que descredibiliza a lista e, por via disso, nem sequer ter a possibilidade – ou ter mais dificuldade – em eleger membros para a assembleia. Podem ficar sem representação.
Se optarem, entretanto, por não concorrer à câmara, mas apenas à assembleia, também por esta via a visibilidade da lista diminui muito, pois é à câmara que as pessoas e os meios de comunicação dão mais atenção e assim correm o risco de nem para a assembleia elegerem membros.
Repare-se que este problema não existe na eleição dos órgãos das freguesias. Nestas, como há só uma lista, a lista para a assembleia de freguesia, se o partido ou o grupo de cidadãos não ganhar a presidência da junta por não ter sido a lista mais votada, podem membros seus ficar na assembleia de freguesia, se tiverem votos suficientes (aplica-se o método d’Hondt) e ainda podem pertencer até à junta de freguesia, se não houver uma maioria da lista vencedora e o presidente da junta os propuser para integrar este órgão.
Este sistema eleitoral é mais simples e o seguido, com pequenas diferenças, nos países que nos são mais próximos (Espanha e França). Aliás, este modo de eleição poderia ser aplicado aos municípios, pois não há, desde a revisão constitucional de 1997, obstáculo a isso. Falta só a aprovação de uma lei com maioria de 2/3 que tal estabeleça. É assunto que deveria merecer reflexão e não tem merecido.
A lei eleitoral tal como está tem, através deste e de outros obstáculos introduzidos pela Lei n.º 1-A/2020, de 21 de Agosto, e aqui não são tratados, o claro efeito de dificultar no que toca aos municípios uma mais ampla participação democrática dos cidadãos na vida autárquica local, o que não é aceitável.
Pena foi que, em vez disso, o legislador não tivesse tratado de impedir nomeadamente a candidatura de falsos independentes. Ou seja, independentes que só o são por perderem eleições internas ou por conflitos dentro dos seus partidos. Impunha-se que se travasse a passagem imediata de cidadãos da condição de militantes partidários a independentes, situação que não credibiliza nem os partidos, nem os independentes, também denominados grupos de cidadãos eleitores.