Risco de contágio por covid-19: vamos lá limpar o ar!
A melhoria da ventilação no interior dos edificios deve ser considerada uma ação importante para diminuir o risco, porém tem sido altamente negligenciada.
Como é bem explicado num editorial da famosa revista British Medical Journal, depois de alguns meses de dúvidas, já está bem estabelecido que os aerossóis têm um papel importante na transmissão do virus SARS-CoV-2 (BMJ 2020;370:m3206). Assim, a transmissão através do contacto com superfícies contendo o virus tem vindo a ganhar menor importância.
O risco da inalação de aerossóis pode ser reduzido pelo distanciamento social, limitando a interação em recintos fechados, evitando a recirculação do ar, melhorando a ventilação natural e artificial e recorrendo a soluções inovadoras de engenharia que coletam e neutralizam aerossóis para fornecer um ar limpo em ambiente familiar e comunitário.
O distanciamento físico deve ser visto como apenas uma parte de uma abordagem de saúde pública mais ampla para conter a pandemia da covid-19. Em vez de regras de distância física únicas e fixas, têm sido propostas algumas recomendações para reduzir o risco de inalação de aerossóis, baseadas em três vertentes (intensidade da emissão, tempo de exposição e ventilação) que refletem melhor os múltiplos fatores que se combinam para o estabelecer (BMJ 2020;370:m3223).
A melhoria da ventilação no interior dos edificios deve ser considerada uma ação importante para diminuir o risco, porém tem sido altamente negligenciada.
Risco de infecção baseado na monitorização do Dióxido de Carbono (CO2)
A concentração de CO2 nos espaços interiores representa um indicador da qualidade do ar, da adequada renovação do ar e se há ar fresco suficiente dentro dos edifícios. As diretrizes da qualidade do ar em edificios não industriais estabeleceram um limite superior de 1000 ppm para concentrações de CO2 na maioria dos países desenvolvidos, incluindo Portugal (Decreto-Lei n.º 79/2006, de 4 de Abril, publicado no Diário da República, I Série-A, n.º 67). Recentemente, o britânico Building Research Establishment considerou um valor de CO2 superior a 1400 ppm um índice de muito baixa qualidade do ar. Num estudo realizado em 2007-2008, em Portugal, em 557 habitações (quarto e cozinha), constatou-se que 7,6% das medições do CO2 se encontravam acima de 1000 ppm.
O CO2 é co-exalado com aerossóis contendo SARS-CoV-2 por pessoas infectadas pela covid-19 e pode ser usado como medição indireta de concentrações do virus SARS-CoV-2 dentro dos espaços fechados. Estas medições de CO2 podem ser realizadas por sensores de baixo custo facilitando a monitorização generalizada do risco de transmissão de aerossóis contendo o virus da covid-19.
Em Espanha, o Ministério da Ciência e Inovação (através do Consejo Superior de Investigaciones Científicas) já publicou recomendações para as escolas sobre como se devem ventilar as salas de aula para reduzir o risco de contágio pela covid-19. Tal como nos indica a REHVA (Federation of European Heating, Ventilation and Air Conditioning), devem abrir-se as janelas o máximo possível durante o horário escolar e garantir uma boa ventilação durante os intervalos. Para obter o melhor fluxo e renovação de ar, é recomendável abrir as janelas e as portas em dois lados diferentes da sala, de forma a condicionar uma ventilação cruzada.
Em vez de se terem tantos gastos em produtos de limpeza nas escolas e outros espaços públicos fechados, porque não monitorizar de forma proactiva os niveis de CO2 para poder implementar melhores medidas de ventilação?
Assim, para além de utilizarmos uma máscara corretamente ajustada, reduzirmos o tempo de exposição, aumentarmos a distância interpessoal, vamos lá limpar mais o ar através de uma adequada ventilação!
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico