O insucesso escolar é um problema de todos… mas tem responsáveis conhecidos
Os resultados no TIMSS são um sonoro alerta e, no mínimo, exigem a avaliação das políticas educativas implementadas entre 2015/2016 e 2018/2019, pois, na ausência de outros fatores explicativos, deve ser nessas políticas que se hão de encontrar razões para a desilusão.
Os resultados obtidos pelos alunos portugueses do 4.º ano, nos testes internacionais “TIMSS”, realizados em 2019 e de todos conhecidos, “não foram famosos”. Os políticos, como normalmente acontece nestas situações incómodas, procuram desviar ou, pelo menos, atenuar as suas responsabilidades e vêm a terreiro criar cortinas de fumo ou alijar responsabilidades, ou ambas.
O secretário de Estado Adjunto e da Educação (SEAE), Dr. João Costa, é um hábil jongleur de mots. Há cinco anos veio dizer-nos que o sucesso escolar não tinha dono. Que os excelentes resultados obtidos pelos alunos nos testes internacionais PISA e TIMSS, em 2015, foram uma vitória de todos. Esta tese, nada inocente, teve como efeito óbvio desvalorizar o trabalho do ministro da Educação da altura, Nuno Crato, de cujas políticas era feroz crítico.
Em 2020 foram publicados os resultados do TIMSS, realizado em 2019 por alunos escolarizados durante o mandato do Governo do PS, no qual o Dr. João Costa tinha desempenhado funções de Secretário de Estado da Educação.
Os resultados foram medíocres e bastante piores que em 2015, o que não foi surpresa para muitos que viram com ceticismo as medidas de política educativa tomadas a partir de finais de 2015, de que destaco o modelo integrado de avaliação dos alunos do ensino básico, a eliminação das provas finais dos 4.º e 6.º anos e a revisão curricular encetada em 2017. Os primeiros sinais de que os resultados iriam piorar surgiram logo em 2018, com o PISA.
Agora, perante os fracos resultados no TIMSS, esperava-se que o SEAE e o próprio ministro da Educação fossem capazes de identificar e apresentar, às escolas e ao país, as causas, uma que fosse, para que se pudesse compreender tal descalabro.
Mas não foi isso que aconteceu. As primeiras palavras que o SEAE proferiu, para além de deselegantes, foram injustas e descabidas: não só não assumiu qualquer responsabilidade pelos resultados como foi lesto a sacudir a água do capote e a apontar culpas a Nuno Crato, que nada teve a ver com a escolarização dos alunos que realizaram o TIMSS-2019.
E a segunda oportunidade também foi desperdiçada. Num artigo no jornal PÚBLICO, o SEAE, referindo-se aos resultados no TIMSS, apresentou sete factos que nada justificam nem nada explicam. Nenhum deles aponta para as causas do insucesso e alguns não são mais que louvaminhas ao trabalho que o Ministério da Educação está a desenvolver – com o fervoroso apoio de alguns especialistas em Educação, diga-se – e que o TIMSS, cruamente, veio colocar à vista de todos.
Mas então, que nos dizem os resultados do TIMSS 2019? Que caminhos de análise nos abrem?
Dizem-nos que os alunos portugueses que frequentavam o 4.º ano em 2019 obtiveram resultados francamente piores que os obtidos pelos alunos do 4.º ano em 2015.
Dizem-nos que os alunos que frequentaram o 1.º ciclo entre 2011/2015 estavam mais bem preparados ou, utilizando a atual terminologia educativa, aprenderam mais que os alunos que frequentaram o 1.º ciclo entre 2015/2019. Dizem-nos, com meridiana nitidez, que o “sistema educativo” relaxou e perdeu em exigência.
Estes resultados são um sonoro alerta e, no mínimo, exigem a avaliação das políticas educativas implementadas entre 2015/2016 e 2018/2019 pois, na ausência de outros fatores explicativos, deve ser nessas políticas que se hão de encontrar razões para a desilusão do TIMSS-2019.
Se nada se fizer, estes resultados serão um importante preditor de resultados futuros, nestes e noutros testes internacionais, nos quais os portugueses apresentavam melhorias desde há décadas e estão a piorar.
Se não se admitir a possibilidade de as causas deste insucesso terem a sua raiz nas políticas educativas implementadas pelo Governo anterior, não se fará uma análise correta nem honesta de um problema que a todos afeta.
Se não se colocarem em causa os difusos conceitos de “aprendizagens essenciais” e de “autonomia e flexibilidade curricular”, em torno dos quais passou a girar o sistema educativo; se os responsáveis continuarem a desvalorizar os resultados e a manter totalmente ausentes dos discursos político e educativo a avaliação sumativa e a avaliação externa, a tendência será piorar.
A generalidade dos portugueses apenas poderá almejar à desejada ascensão social por via da Educação e da Escola públicas. Para que tal aconteça, estas têm de ser exigentes e de qualidade. É absolutamente necessário estabelecer metas e objetivos claros e ambiciosos, compreensíveis pelos alunos, pelos professores e pelas famílias. As aprendizagens devem ser objeto de avaliação externa, pois apenas ela permitirá perceber se essas metas e objetivos foram alcançados, bem como estabelecer as necessárias e adequadas medidas corretivas.
O engajamento e a adesão dos alunos, dos professores e das famílias em torno dos objetivos e metas a alcançar apenas será possível se a avaliação externa contar. Se a avaliação conta, todos se focam e interessam, se não conta, dispersam.
Diz o SEAE que o sucesso escolar “não é um problema deste ou daquele. É, em primeira instância, um problema social…”. Trata-se de uma meia-verdade à qual devemos acrescentar a outra metade: todos sofremos com o insucesso e com resultados escolares medíocres, mas apenas alguns são responsáveis pelas políticas que lhes dão origem.
Sabemos bem quem foram e quem são os responsáveis pelas políticas que deram origem aos resultados escolares verificados no TIMSS-2019.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico