Começou a vacinação para a covid-19 nos Açores. “A esperança é que a vida comece a ficar um bocadinho mais fácil”

A região, que regista 345 casos, começou esta quinta-feira a vacinação contra a covid-19 em duas ilhas em simultâneo. Profissionais de saúde e idosos institucionalizados serão os primeiros a receber a vacina.

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Marina Tavares a ser vacinada contra a covid-19 Hugo Moreira
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Vacinação nos Açores começou esta quinta-feira Hugo Moreira
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Enfermeira foi a primeira a ser vacinada Hugo Moreira
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Vacina da Pfizer/BioNTech Hugo Moreira
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O pequeno centro de convívio do lar de idosos da Santa Casa da Misericórdia de Vila de Franca do Campo ficou entupido de jornalistas e entidades oficiais. O momento estava marcado para as 10h (hora local). O foco de toda a atenção estava em Marina Tavares: naquela altura estavam todos à volta da enfermeira que recebeu a primeira vacina contra a covid-19 em São Miguel.

“Tenho de dizer que me sinto um bocadinho ansiosa, não é? Mas tenho confiança em todo o trabalho que foi feito para chegarmos a esta fase”, confessou a enfermeira ao PÚBLICO antes de ser vacinada. A ansiedade viria a aumentar nos minutos seguintes. À hora certa, Marina sentou-se numa poltrona preta. E aí ficou na meia hora seguinte, fitada por todos os que ali estavam. A vacinação começou atrasada por exigências técnicas que obrigaram ao repouso da vacina no período após o frio. Os minutos arrastaram-se e o tão esperado momento só chegou quando o relógio bateu as 10h30. A vacina foi administrada e as palmas ecoaram na sala.

“A esperança é que a vida comece agora a ficar um bocadinho mais fácil. Claro que temos um longo caminho a percorrer, mas acredito que 2021 seja um bocadinho melhor do que este ano de 2020”, afirmou Marina, que trabalha há 12 anos naquele lar de idosos, já após a vacina.

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Um ano melhor que deve contrastar com o 2020 difícil que agora vai encerrar. Um ano de “muito desgaste”, assume a enfermeira de 35 anos. Quando fala em esperança, Marina Tavares incide, sobretudo, no futuro dos idosos daquele centro. “Foi um tempo muito difícil para nós e para os nossos utentes, foram quem sofreu mais. Não podem estar com as suas famílias ou é tudo com distância, onde não pode haver afecto. É muito complicado”.

Numa ocasião tão especial, a ansiedade não estava apenas do lado de quem recebe. Sara Freitas, de 40 anos, enfermeira há 17, foi a responsável pela administração. “Os enfermeiros estão muito habituados a fazer vacinas todos os dias. No entanto, esta é especial, tem um sabor diferente”, assumiu ao PÚBLICO. Para ela, a chegada das vacinas ao arquipélago é a “luz ao fundo do túnel” e o “início de uma grande caminhada”.

A vacinação é também o “culminar de um processo”, uma vez que os últimos dias foram destinados à “preparação de toda a logística”. Todos os 29 utentes do lar da Santa Casa da Misericórdia de Vila Franca do Campo vão ser vacinados neste último dia de 2020. No plano de vacinação regional, além dos profissionais de saúde (como acontece no continente), também é dada primazia aos idosos institucionalizados.

“Os dias passavam e nós só tínhamos em mente a protecção dos idosos, porque eles estavam isolados aqui dentro e nós é que poderíamos ser os transmissores. Ninguém queria ficar com esse peso na consciência”, prossegue Sara Freitas, que reconhece a “responsabilidade” de vacinar as primeiras doses que chegam à região: “É a sensação de que estou a dar um escudo protector a este lar.”

“Princípio do fim”

O lar da Santa Casa de Vila Franca do Campo não registou qualquer utente com covid-19. A escolha do local para o primeiro momento da vacinação deve-se ao número de casos diários que têm sido registados em Vila Franca do Campo. Aquele concelho tem actualmente 98 casos de covid-19. É o segundo com mais casos dos Açores, menos dois do que a Ribeira Grande, que já testou em massa toda a população da sua freguesia mais populosa.

Por isso, para o provedor da Santa Casa, é uma “alegria enorme” receber uma parte das primeiras vacinas do arquipélago. “Temos sofrido muito nesses tempos e, como aconteceu pelo país fora, vivemos numa pressão terrível. Às vezes, faltava-me o sono de tão preocupado”, revela Lucindo Couto, confiante de que a vacina é o “princípio do fim” deste “pandemónio”.

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Após o frenesim do momento simbólico da primeira vacina, as enfermeiras começaram a ir buscar os utentes para também eles serem vacinados. Mas, em simultâneo, os jornalistas foram convidados a sair porque naquele local só estava previsto a publicitação da vacinação aos profissionais de saúde. O primeiro dia de vacinação nos Açores dividiu-se em dois momentos em duas ilhas diferentes: ao mesmo tempo que decorria a vacinação no lar da Santa Casa de Vila Franca do Campo, também era ministrada a primeira vacina a um idoso no centro social de idosos São Francisco Xavier, na freguesia do Raminho, na Terceira. Equidade entre ilhas: uma ficou com a primeira vacina a um profissional de saúde, outra ficou com a primeira vacina a um utente de um lar de idosos. Na Terceira, a primeira pessoa a receber a vacina foi Ilda Conceição, de 98 anos.

Horas antes, o secretário regional da Saúde tinha explicado os critérios da região para a vacinação: “Os idosos constituem a população mais débil, a mais vulnerável e com a maior taxa de mortalidade”. Clélio Meneses falava aos jornalistas num início de dia que começou bem cedo. As vacinas, que chegaram à Terceira na noite de quarta-feira, viajaram para São Miguel às 7h desta quinta-feira. Às 8h, foi entregue a primeira caixa de vacinas à unidade de saúde de São Miguel, no Hospital Divino Espírito Santo, em Ponta Delgada.

Foi a primeira caixa de um total de 9750 doses que os Açores vão receber na primeira fase da vacinação. Da primeira remessa, o governo regional pretende aplicar cinco mil vacinas em dez dias, nas ilhas de São Miguel e Terceira. Dos 345 casos positivos activos no arquipélago, 292 estão São Miguel, 37 na Terceira, um no Pico, quatro em São Jorge, dois nas Flores e nove no Faial. Desde o início da pandemia, a região já registou 1.942 casos e 22 mortes.

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Por tudo isso, o início da vacinação no último dia de um ano marcado por uma pandemia que abalou a vida colectiva é sobretudo simbólico. Como se este ano quase findado deixasse, apesar de tudo, o caminho feito para um ano melhor. É a “esperança” em 2021, como se diz naquele lar da Santa Casa em Vila Franca do Campo. Palavra de provedor. “Eu tenho uma esperança enorme. Eu acredito muito na vacina. Acho que temos todas as razões para ter esperança num 2021 melhor.”

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