Matemática, TIMSS e trabalho em curso

Há cinco anos, publiquei um texto neste jornal, intitulado “O sucesso escolar não tem dono”. Não é um problema deste ou daquele. É, em primeira instância, um problema social que não se resolve vendo quem grita mais alto.

A propósito dos resultados dos alunos portugueses a Matemática no último TIMSS, importam os factos:

Facto 1: Os alunos que participaram neste estudo frequentavam o 4.º ano em 2018/2019, tendo entrado para o 1.º ano em 2015/2016, ano em que o XXI Governo tomou posse.

Facto 2: Os alunos desse ano já não realizaram exames no final do 4.º ano.

Facto 3: O XXI Governo desenvolveu e tem vindo a implementar, no plano curricular, um conjunto integrado de políticas educativas, das quais vale a pena referir: as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, com identificação de conteúdos e estratégias na área da numeracia, o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania, o regime jurídico da Educação Inclusiva, o Programa Nacional para a Promoção do Sucesso Escolar, o Apoio Tutorial Específico, o lançamento do Plano Nacional de Leitura para a década 2017-2027 e do Plano Nacional das Artes, a Flexibilidade Curricular, a identificação de Aprendizagens Essenciais, a introdução de provas de aferição com informação desagregada e qualitativa, a regulação progressiva da rede do Ensino Profissional.

Facto 4: De todas estas medidas, apenas o fim dos exames de 4.º ano afetou os alunos que participaram no TIMSS 2019. Ou seja, estes alunos trabalharam ainda com os Programas de 2007 – revogados antes do prazo normal de seis anos de vigência e sem avaliação – e beneficiaram do Plano de Ação da Matemática – cujo relatório de impacto e eficácia não foi divulgado. Tudo o resto entrou em vigor apenas para o 1.º ano de escolaridade em 2017/2018 nas escolas-piloto e em 2018/2019 nas restantes.

Facto 5: Não há correlação entre a introdução de mais autonomia e flexibilidade na gestão do currículo e os resultados do TIMSS 2019 por duas razões principais: os alunos que participaram no estudo não foram abrangidos por esta medida; o ensino particular e cooperativo já dispunha deste instrumento e do mesmo grau de autonomia e não consta que tenha piores resultados por isso.

Facto 6: Não há correlação entre os resultados do TIMSS 2019, ou do PISA 2018, e a existência de exames no final do primeiro ciclo por duas razões principais: a trajetória ascendente nos vários estudos, desde final dos anos 90, nunca foi acompanhada de exames de final do 1.º ciclo, mas sim pelas então consideradas inúteis e facilitistas Provas de Aferição; além disso, quando se tenta estabelecer a mesma correlação entre resultados de outros países e o desempenho no TIMSS, nada sustenta que os melhores desempenhos aconteçam em países com exames no final do 1.º ciclo. Na verdade, a generalidade dos países não os tem.

Facto 7: O Governo tem vindo, desde a legislatura anterior e com menção específica no Programa do XXII Governo, a estudar e a agir sobre a aprendizagem da Matemática. Listo as seguintes iniciativas: auscultação de escolas, associações profissionais, sociedades cientificas e representantes dos encarregados de educação (desde 2016); sistematização de dados das classificações a Matemática, que analisam o seu perfil com diversas variáveis de contexto, como as utilizadas nos estudos internacionais (desde 2017); produção de orientações para a gestão das Metas Curriculares do Ensino Secundário (em 2016), face à evidência de ausência de tempo para sistematização e cobertura de todos os conteúdos; introdução da competência essencial “Raciocínio e Resolução de Problemas” no Perfil dos Alunos – área em que os alunos portugueses tiveram piores desempenhos (2017, em vigor para todas as escolas em 2018/2019); participação no estudo internacional de análise comparativa dos currículos de matemática (desde 2018); publicação das 50 medidas com maior eficácia desenvolvidas por escolas e municípios no âmbito do PNPSE (em 2019); criação do Grupo de Trabalho coordenado pelo Professor Jaime Carvalho e Silva com a missão de analisar a evolução dos resultados da disciplina nas duas últimas década, a eficácia e a eficiência dos diferentes planos e medidas dirigidas à melhoria das aprendizagens em Matemática e à promoção do sucesso escolar, a evolução dos resultados dos estudos de comparabilidade internacional, os instrumentos de avaliação interna e externa, as metodologias de ensino e o seu impacto nos resultados. Deste trabalho foi produzido em 2019 um relatório de recomendações, do qual resulta, entre outras medidas, a necessidade de revisão das orientações curriculares.

Tudo isto são factos, quase todos bastante noticiados e discutidos na apresentação de resultados do TIMSS à imprensa. Existe uma ação continuada por parte do Ministério da Educação; não há revogação de legislação sem avaliação do que está em vigor, mesmo que isso torne os processos mais morosos. A escola é um lugar onde se ensina e se aprende. E é quando se aprende que se obtêm resultados. Por isso, não hesitamos em assumir “o discurso das aprendizagens”, porque sem estas não há resultados.

Há cinco anos, publiquei um texto neste jornal, intitulado “O sucesso escolar não tem dono”. Não é um problema deste ou daquele. É, em primeira instância, um problema social que não se resolve vendo quem grita mais alto.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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