A fome ronda os campos de refugiados eritreus na Etiópia
Acabaram-se os alimentos nos campos onde estão refugiados milhares de eritreus que fugiram à perseguição do Presidente Isaias Afwerki. Foram apanhados pela guerra em Tigré e, diz o ACNUR, a sitação agrava-se de hora a hora.
Milhares de refugiados da Eritreia na região nortenha da Etiópia onde decorre um conflito armado estão sem qualquer alimento, disse nesta terça-feira o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), que pediu que seja criado com urgência um corredor de abastecimento de forma a evitar uma tragédia humanitária.
As comunicações e o acesso a Tigré foram bloqueadas pelo governo etíope no início do conflito entre as forças federais e a liderança tigré, no início de Novembro.
Cerca de cem mil eritreus refugiaram-se naquela região da Etiópia para escaparem à perseguição política e fugirem ao serviço militar obrigatório. A Eritreia é governada com mão de ferro pelo Presidente Isaias Afwerki, no poder desde 1991. Prisões arbitrárias, recrutamento militar e trabalhos forçados, perseguição a minorias religiosas e a jornalistas são constantes num país de onde muitos optaram por fugir. Nada mudou após o acordo de paz com a Etiópia, em 2018.
“A nossa preocupação aumenta de hora a hora”, diz o ACNUR. “Já não há alimentos nos campos [de refugiados] –, o que torna a fome e a malnutrição um perigo real, um aviso que temos vindo a fazer desde que o conflito começou há quase um mês. Estamos também alarmados com os relatos não confirmados de ataques, raptos e recrutamento forçado nos campos de refugiados”, escreve o ACNUR.
Prossegue: “Nenhum civil deve tornar-se um alvo, e todas as medidas devem ser tomadas por todas as partes para assegurar que é assim – sejam as pessoas refugiados, deslocados internos, membros das comunidades ou funcionários humanitários”.
Durante quase duas décadas, a Etiópia foi um país “hospitaleiro” para os refugiados eritreus, mas “receia-se agora que sejam apanhados no conflito”, prossegue a agência da ONU, notando que os campos estão a ser alvo do conflito que opõe o Governo etíope à região de Tigré.
A guerra começou quando o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, a quem a paz com a Eritreia deu o Prémio Nobel da Paz em 2019, iniciou uma ofensiva militar, a 4 de Novembro, em resposta ao que considerou ser um ataque contra uma unidade militar federal por parte das forças do estado autónomo do Tigré. Ahmed disse que pretendia substituir as autoridades regionais da Frente Popular de Libertação do Tigré (FPLT) por “instituições legítimas”.
Não havendo comunicações na região, é difícil saber-se exactamente como está a situação no terreno. No sábado, o chefe do Governo etíope anunciou que o exército federal tinha assumido o controlo de Mek'ele, a capital do Tigré, e que dava início à perseguição dos líderes regionais.
A guerra entre as forças federais a FLPT levou dezenas de milhares de pessoas a fugirem para o Sudão, estimando-se que possam vir a chegar aos 200 mil. O foco, diz o ACNUR, tem estado nestes refugiados, mas a situação nos campos de eritreus em Tigré piora a todo o instante.
Ao Sudão, diz o relatório desta terça-feira do ACNUR, continuam a chegar refugiados e são já 40 mil. Só desde sexta-feira entraram mais 2500 – a agência diz que podem vir a ser cem mil nos próximos seis meses e pede uma resposta humanitária, que se concretize em dinheiro e na abertura de canais humanitários que permitam levar alimentos e abrigo a estes refugiados, e aos que estão em Tigré.