Nos concelhos que saíram da lista de risco não se canta vitória. E pedem-se mais dados locais sobre a covid-19

Moimenta da Beira, São João da Pesqueira, Mesão Frio, Pinhel, Tondela, Batalha e Tabuaço foram os sete territórios que passaram a verde na lista do Governo. Nestes concelhos, apesar do “alívio”, promete-se que não se vai baixar os braços na luta contra a covid-19.

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GABRIEL SOUSA

Foram nove os dias em que Moimenta da Beira, São João da Pesqueira, Mesão Frio, Pinhel, Tondela, Batalha e Tabuaço estiveram na lista de municípios com regras mais apertadas para enfrentar o avanço da pandemia de covid-19 em Portugal. Estes sete concelhos saíram esta sexta-feira da “lista vermelha” e não terão de obedecer ao elenco de regras apertadas — onde se inclui o recolher obrigatório, o dever de ficar em teletrabalho sempre que possível e horários mais apertados para o comércio — que vão vigorar a partir de segunda-feira num total de 191 municípios portugueses.

Apesar de encararem esta notícia como um “alívio”, os autarcas destes concelhos, quase todos do Centro, não cantam vitória: é preciso continuar a adoptar comportamentos responsáveis para que, por um lado, a doença não se espalhe naqueles territórios e, por outro, para que não voltem a ser incluídos na lista de concelhos de risco elevado.

Alguns dos presidentes de câmara contactados pelo PÚBLICO afirmam que há falta de informação sobre os números da covid-19 e dizem que isso complica a actuação da autarquia. Esta segunda-feira fará três semanas que os dados de infecções por concelho não são divulgados pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), que está a fazer uma reformulação deste indicador. Na próxima semana, os boletins diários deverão conter o número de casos por concelho, bem como a incidência dos últimos 14 dias (número de casos por cada 100 mil habitantes), segundo garantiu esta sexta-feira a ministra da Saúde. Marta Temido afirmou que esta informação vai contribuir “para que todos estejam melhor informados sobre aquilo que é a situação real do local onde residem”.

Saída da lista “não pode significar relaxamento"

O município de Moimenta da Beira, no distrito de Viseu, já tinha contestado a inclusão na lista de 121 concelhos de risco elevado por acreditar que o concelho não preenchia todos os requisitos para tal acontecer.

Para José Eduardo Ferreira, a notícia é sinónimo de “satisfação”, mas o autarca admite que não deixa de estar preocupado, mesmo que o seu concelho tenha passado esta sexta-feira a verde. “Não é por termos saído que podemos abrandar as medidas que a população tem que tomar permanentemente para impedir o crescimento da covid-19, que tem sido enorme no país todo e em especial na região Norte”, refere o presidente da Câmara de Moimenta da Beira. Não haverá um descuido na “vigilância”, garante.

Apesar de o número de casos da doença estar abaixo dos 240 casos por cada 100 mil habitantes nos últimos 14 dias (um dos critérios para a entrada de concelhos na “lista vermelha"), o autarca afirma que Moimenta tem assistido a um aumento muito significativo de infecções, algo que “não deixa ninguém despreocupado”.

O concelho, que tem 10.201 habitantes, tinha até esta quinta-feira um total de 89 casos — cerca de 30 estão ligados a um surto num Lar em Alvite. “A nossa população vai poder ter mais normalidade, mas isso não pode significar abrandar os cuidados. Precisamos de reforçar este equilíbrio entre ter vidas mais normais com a manutenção das medidas que são indispensáveis”, diz.

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Centro de rastreio em Mondim de Basto NELSON GARRIDO

Para o autarca de Tondela, também no distrito de Viseu, a luta contra a doença terá de continuar a passar pelas medidas de autoprotecção, sem esquecer que não poderá haver “um relaxamento” para impedir que situações pontuais se transformem em grandes surtos que não se conseguem estagnar. “Vamos tentar manter esta trajectória para que a nossa situação não mude daqui a uma semana ou duas”, diz José Jesus.

Em Mesão Frio, Vila Real, a notícia da saída da lista de risco foi recebida com “alívio”, sendo uma “lufada de ar fresco”, principalmente para os comerciantes, que vão poder estar de portas abertas já este fim-de-semana. Alberto Pereira, presidente da câmara, diz que não fazia sentido o concelho “continuar a ser penalizado” visto ter apenas 25 casos confirmados e “apenas dois ou três” activos.

Ao PÚBLICO, o gabinete de comunicação da Câmara de Tabuaço afirma que o esforço que foi necessário para “sair da lista negra” não dependeu do executivo, mas sim do trabalho conjunto da população. “Temos mais influência a controlar o que acontece do que a prevenir, até porque tudo depende do comportamento de todos”, referiu.

Autarcas queixam-se de falta de informação

Uma das preocupações das últimas semanas tem sido a falta de números da covid-19 que, em alguns casos, não chega às mãos dos autarcas — ou chega com atraso de pelo menos um dia. “No Agrupamento de Centros de Saúde a que pertencemos não está disponível essa informação, nem para mim nem para ninguém. E, tratando-se de uma informação clínica, ou é a autoridade de saúde a fornecê-la ou ela não existe”, diz o autarca de Moimenta da Beira, referindo-se ao número de casos activos e de casos recuperados.

O caso de Paulo Santos, presidente da Câmara da Batalha, é semelhante: a Unidade de Saúde Familiar transmite alguma informação diária, mas muitas vezes com atraso e com discrepâncias. “Ninguém pode gerir aquilo que não conhece”, diz, acrescentando que aquela autarquia do distrito de Leiria tem o seu próprio sistema para monitorizar estes números.

Para o presidente da Câmara de São João da Pesqueira, os autarcas têm tido pouca informação no que toca à evolução da doença. “Parece que se desconfia dos presidentes de câmara”, aponta Manuel Cordeiro. “A única coisa que recebemos ao final do dia é um e-mail com os números totais, mas gostávamos de ter mais informação até para ajudar a fiscalizar o cumprimentos de regras”.

Até ao mês de Outubro, São João da Pesqueira (em Viseu) era um dos poucos concelhos portugueses a registar zero casos de covid-19, mas tudo mudou em poucas semanas. Há agora 35 casos confirmados e “oito ou dez activos”. “Os casos começaram a acontecer naquelas semanas que serviram para contabilizar os concelhos que iam entrar na lista. A população nem percebeu bem, tivemos de explicar que o que contava eram os casos dos últimos 14 dias e não os casos totais”, conta.

Mas nem todos os autarcas afirmam que tem existido falta de comunicação entre as várias entidades que fazem a gestão da covid-19 nos concelhos. No caso de Pinhel, no distrito da Guarda, a solução foi criar um grupo de conversa comum à autarquia, às autoridades e às forças de segurança e bombeiros. “Vamos comunicando e desta forma conseguimos controlar melhor as várias situações. Não quer dizer que consigamos controlar tudo, mas há uma proximidade grande. Se uma família ficar em confinamento em casa, arranjaremos forma de lhes levar as compras a casa. Ou se uma pessoa de idade tiver que ir fazer o teste [à covid-19] e não tiver transporte, há uma carrinha que a vai levar ao centro de saúde para fazer o teste. É mais fácil fazer esta gestão em conjunto”, explica Rui Ventura, que encarou a saída da lista como uma “responsabilidade acrescida”.

Batalha sem delegado de saúde há dois meses

O município da Batalha, que tem 23 casos activos, num total de 114, tentou, nas últimas semanas, aumentar o número de testes realizados, as capacidades de rastreamento e distribuiu máscaras pela população para prevenir o aparecimento de novas infecções e tentar ajudar o departamento de saúde pública do concelho que, nas palavras do presidente da câmara, “está muito debilitado” – não tem um delegado de saúde há mais de dois meses.

“A situação não mudou e tem sido a autarquia, juntamente com os médicos dos cuidados primários, a fazer esse trabalho. No nosso ponto de vista, os trabalhos de inquérito epidemiológico não podem ser feitos por médicos, que estão ocupados com outros doentes”, diz Paulo Santos. Esta falta de recursos dificulta o processo de um cidadão passar de doente a caso recuperado, bem como a comunicação com os doentes que estão em isolamento em casa.

Paulo Santos afirma que as medidas por concelho não são as mais adequadas e devia ser adoptada uma estratégia por área metropolitana ou, em último caso, por região. “No caso da Batalha, os munícipes não podiam fazer compras no comércio local ou ir a um restaurante a partir de uma certa hora, mas se fossem a um concelho vizinho já podiam”, refere o autarca, dizendo ainda que a população ficou “confusa” com a quantidade de “regras e excepções” anunciadas nas últimas semanas. “A batalha só poderá ser ganha se nós envolvermos as pessoas porque esta depende muito delas”.

A partir das 0h de segunda-feira são 191 os concelhos que fazem parte da lista de alto risco de contágio de covid-19 aprovada pelo Governo esta quinta-feira — um total de 8.445.007 pessoas serão afectadas, 86% da população residente no continente. Apenas 13,7% da população está fora das restrições por residir nos 87 concelhos que não estão na lista, segundo contas da Lusa a partir de dados oficiais.

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