Ética Republicana
No SNS, a maior parte das vezes assistimos a direções médicas selecionadas com critérios discutíveis e nomeadas ad aeternum, sem muitas vezes serem avaliadas, em que a filiação partidária conta mais que a qualidade do trabalho e dos curricula.
Um dos problemas atuais do Serviço Nacional de Saúde tem sido a incapacidade de fixar os seus profissionais, nomeadamente os médicos.
Devido à pandemia, ou não, que se instalou no mundo, as reformas urgentes e necessárias a fim de reverter a situação, criada pelos anteriores governos, não estão a ser efetuadas.
Continuamos a assistir à destruição das Carreiras Médicas e à desvalorização de todos os profissionais de saúde com uma política de baixos salários. Os médicos ainda não atingiram os valores remuneratórios de antes do período de austeridade a que o país foi sujeito.
Continuamos a assistir à fuga de médicos para o sector privado ou para o estrangeiro esvaziando os serviços, o que ameaça gravemente o futuro do SNS.
Os conselhos de administração, nomeados na maioria dos casos, não administram e praticam a lei do “chicote e da cenoura”, sem qualquer autonomia, impondo aos serviços diretores do seu agrado.
A maior parte das vezes assistimos a direções médicas selecionadas com critérios discutíveis e nomeadas ad aeternum, sem muitas vezes serem avaliadas, em que a filiação partidária conta mais que a qualidade do trabalho e dos curricula.
Conselhos de Administração que, em vez de promoverem uma hierarquia por competência técnico-profissional, preferem fomentar a espiral do medo.
Onde está o novo modelo organizacional dos serviços e hospitais numa perspetiva moderna de equipas pluridisciplinares e de transdisciplinaridade? O êxito de qualquer modelo organizacional passa pela participação.
A participação é a concertação organizada a todos os níveis da estrutura, desde a base até ao topo, para que todos aquelas e aqueles que trabalham saibam, com clareza, para quem e para quê servem os seus esforços diários.
A participação é também o interesse de todos em função de objetivos traçados à partida.
Um exemplo de que nada mudou pode ver-se no serviço de otorrinolaringologia do Centro Hospitalar de Lisboa Norte.
À data da nomeação do director deste serviço, 1 de Novembro de 2016, apresentei, como presidente do Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos, um protesto dirigido ao então Conselho de Administração desse hospital, alegando que o cargo devia ser provido por concurso público.
Acontece que, se tivesse sido aberto um concurso, o médico nomeado não podia concorrer por não preencher os requisitos legais para admissão.
Como é habitual nestes casos, correm vários processos nos tribunais.
A Ordem dos Médicos retirou a idoneidade formativa ao serviço, em Março de 2018, após ter considerado como provado, em auditoria, que existiam factos relevantes que punham em causa “o regular funcionamento assistencial e formativo do Serviço”.
A idoneidade formativa foi reposta, na ausência de qualquer reavaliação, em Janeiro 2020. Isto apesar de fortes críticas do Colégio da Especialidade por não ter sido ouvido nessa decisão unilateral do Conselho Nacional da Ordem dos Médicos, segundo informações de médicos do serviço.
No Boletim Informativo da Secção Regional do Sul da Ordem dos Médicos, 2015, sob o titulo “Troikas de favores”, escrevi: “A troca de favores e a cunha parecem estar inscritas no nosso ADN, provavelmente estarão também em muitos outros povos com realce para os que rodeiam a bacia do mediterrâneo (…) Os concursos para os cargos públicos foram, e bem, instituídos para impedir o funcionamento da cunha e do compadrio (...).” E termino o artigo, dizendo:"(…) Cresci no exemplo de grandes vultos da I República e de combatentes antifascistas que sempre recusaram benesses e cunhas, alguns com o sacrifício das suas próprias vidas. Por isso, a minha acção tem-se pautado pelo combate à cunha e ao compadrio, seja quais forem os argumentos utilizados, e procuro, nem sempre com êxito, ser justo.”
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico