Novos Recursos Próprios – o momento para mais justiça fiscal na União Europeia
Esta é a oportunidade para introduzirmos mais justiça fiscal na União Europeia, através da criação de uma Taxa sobre as Transações Financeiras e de um imposto sobre o digital.
A resposta europeia à crise é necessária e é urgente. Não pode comprometer o futuro das gerações atuais e futuras. A sua arquitetura financeira está apoiada num pilar chave: “Recursos Próprios”. Mas devemos também aproveitar esta oportunidade para tornar os sistemas fiscais europeus mais justos. O Parlamento Europeu aprovou esta semana um relatório que abre, precisamente, caminho para a criação de novos recursos próprios na União Europeia.
Mobilizar novos recursos próprios é uma condição de sucesso para a resposta europeia. As contribuições nacionais baseadas no rendimento nacional bruto respetivo – que representa hoje 70% do orçamento da UE –, associadas à participação de outros recursos próprios como o IVA ou as taxas alfandegárias – que representam cerca de 30% –, não são suficientes para financiar o orçamento da UE e muito menos a resposta europeia à crise.
Por esta razão, a resposta europeia teve, agora, de ser construída tendo na sua base a criação de um Fundo de Recuperação. A Comissão Europeia irá emitir dívida, sendo que as garantias necessárias sairão do orçamento da UE, numa perspetiva de mutualização de dívida, algo completamente inédito na UE. Este Fundo de Recuperação servirá para financiar os programas nacionais de recuperação económica e social, fundamentais para resolver as dificuldades económicas, sociais e orçamentais. As contas públicas dos Estados-membros foram, também elas, brutalmente afetadas pela crise que atravessamos. Sozinhos, os países teriam dificuldade em sair da situação de crise; exige-se uma resposta e ação europeia e a UE está a responder positivamente.
É aqui que entram os “novos” Recursos Próprios. Estes devem servir agora para o pagamento dos compromissos do Fundo de Recuperação (Next generation EU), ou seja, os juros da dívida europeia contraída pela Comissão Europeia em nome da União Europeia, e para financiar o reembolso pelos Estados-membros da ajuda monetária urgente de que beneficiaram.
A não criação de novos recursos próprios poderia levar a um esforço adicional por parte dos países depois de 2028, nomeadamente através de um acréscimo das suas contribuições nacionais. O Parlamento Europeu defende que estes custos devem ser integralmente cobertos por receitas provenientes de verdadeiros novos recursos próprios. Mas num futuro próximo, estes novos recursos próprios devem continuar igualmente a financiar o orçamento da União Europeia, complementando aquelas que são já hoje as suas fontes de financiamento.
Sabemos do que falamos quando falamos de novos recursos próprios. Falamos nomeadamente de uma taxa sobre o plástico, de um Mecanismo de Ajustamento das Emissões de Carbono nas Fronteiras ou do Comércio Europeu de Licenças de Emissão. Mas esta é também a oportunidade para introduzirmos mais justiça fiscal na União Europeia, através da criação de uma Taxa sobre as Transações Financeiras e de um imposto sobre o digital.
Hoje, a situação é bem diferente das dificuldades encontradas em 2014, na sequência da proposta da Comissão Europeia, quando se procurou construir uma cooperação reforçada sobre a Taxa sobre as Transações Financeiras. Não houve vontade política entre os Estados-membros para que esta cooperação reforçada tivesse resultados efetivos. Mas hoje os mercados também estão a reagir hoje de uma forma diferente. Apesar das dificuldades, e são muitas, este é, volto a sublinhar, o momento oportuno para lançar a nível europeu uma Taxa sobre a Transações Financeiras. Mas os europeus também não entendem a situação de privilégio e de injustiça fiscal de que beneficiam as grandes empresas do digital, sector que não foi seguramente o mais afetado pela crise. Uma – a Taxa sobre as Transações Financeiras – e outro – o imposto sobre o Digital – poderão e deverão contribuir assim para o financiamento da UE.
Estes novos recursos próprios não podem constituir um encargo fiscal adicional para os cidadãos e devem ser construídos na linha das prioridades da UE, como o combate às alterações climáticas ou a transição para o digital. Só assim asseguraremos que políticas e programas europeus robustos e devidamente financiados possam trazer um verdadeiro valor acrescentado. Só assim evitaremos o debate recorrente e ensurdecedor a cada sete anos, quando se negoceia o orçamento plurianual da UE, e que se tem centrado em saber se cada Estado-membro deve ter uma contribuição nacional de 1%, 1,1%, 1,3%... do seu Rendimento Nacional Bruto. Um debate que substitui aquele que verdadeiramente deve ser feito: o de saber qual deve ser a ambição da UE.
Deputada Europeia, co-relatora para o Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027
A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico