Quanto vale a TAP para a economia de Portugal?
O desafio do governo é enorme, sem dúvida! Transformar custos em investimento não é fácil. Mas antes de ligar os reatores do crematório, dê-se gás aos reatores dos aviões da TAP.
Ainda o acordo de compra de parte da TAP pelo Estado aos privados se anunciava, e já um arsenal de comentadores bombardeava o ministro Pedro Nuno Santos com os custos que tal acordo poderia trazer para os contribuintes portugueses. O blitzkrieg continuou fim-de-semana a dentro até Marques Mendes vaticinar a TAP de crematório político.
Será já da cinza, ou no meio de tantos comentadores não há quem no horizonte vislumbre que o acordo da TAP não são só custos?
A minha atividade como professor universitário na área da gestão internacional obriga-me a viajar entre a Florida International University, nos Estados Unidos, e a Fundação Getúlio Vargas, no Brasil, até à Universidade de Uppsala, na Suécia. Como não dispenso a minha condição de português, o meu hub é Portugal. E como a academia não tem as comodidades financeiras do mundo corporativo, para poder fazer ‘escala’ em Portugal muitas das vezes tenho que pagar do meu bolso parte deste puzzle de viagens. Esforço este que, salvo raras exceções, a maioria dos comentadores incineradores não faz. Uns porque não viajam (apesar do comentário especialista em assuntos internacionais), outros porque têm o conforto do mundo corporativo a pagar-lhes as deslocações.
É assim, com a legitimidade da minha formação académica mas sobretudo da minha experiência como viajante frequente (e pagador), que me atrevo a lançar água na incineradora em dois pontos apenas:
- Desengane-se quem pense que, sem a TAP, as viagens de todas as outras companhias aéreas se manterão atrativas para os turistas que têm Portugal como destino. Na mais básica disciplina do curso de economia e gestão se aprende que não é preciso sequer haver cartelização ilegal para concertar preços em mercados como o da aviação civil. Aliás, é precisamente o mercado das operadoras aéreas um dos exemplos mais usados para explicar a concertação tácita. Não é preciso sequer a TAP ter os melhores preços. Estando nas mãos do Estado, é uma arma dissuasora para o aumento de preços das viagens para Portugal por parte das restantes companhias aéreas.
- Desengane-se quem pense que, sem a TAP, o turismo conseguirá manter a contribuição que tem tido para a riqueza nacional. São quase 15% do PIB a nível nacional e de 20% só na região de Lisboa. Se já satisfaz comparar a contribuição do turismo a seis Autoeuropa em termos de receitas, imagine-se tal comparação em Valor Acrescentado Bruto (VAB). Sem arriscar, pelo menos 20 vezes o VAB da Autoeuropa. De facto, 1200 milhões de euros parece muito dinheiro, mas nada comparável com os quase 30.000 milhões de euros com que o turismo contribui para a economia nacional.
São apenas dois pontos, mas os bastantes para demonstrar o papel estratégico da TAP na nossa economia. Muitos outros haverá – como a perda de slots ou rotas aéreas – que sustentam os benefícios deste acordo relativamente a uma falência controlada, como a da Suiss Air. Para os mais distraídos, Portugal não está geograficamente no centro da Europa, nem a nossa economia tem a imaterialidade do sector financeiro suíço. O que traz os turistas a Portugal é o nosso clima, as nossas paisagens, os nossos monumentos, e a nossa cultura. Aqui. O que nos coloca no centro do mundo são as rotas aéreas, não as terrestres.
A questão essencial, portanto, não é discutir quanto custa a TAP aos portugueses, mas determinar quanto esta contribui, direta e indiretamente, para a economia portuguesa. O desafio do governo é enorme, sem dúvida! Transformar custos em investimento não é fácil. Mas antes de ligar os reatores do crematório, dê-se gás aos reatores dos aviões da TAP.
P.S.: A ligeireza com se coloca um ministro no incinerador por causa de um investimento na TAP contrasta com a inércia com que se deveria discutir a privatização da EDP, empresa também estratégica como a TAP, mas que, ao invés de trazer riqueza para Portugal como a TAP, delapida a riqueza dos portugueses com as rendas excessivas e dividendos milionários distribuídos ao acionista estrangeiro.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico