Um português pousa a pena no século XVIII
Esta é a quinta conversa da nossa quarta memória, dedicada à emancipação.
No dia 15 de Novembro de 1759 um português pousou a pena com que escrevera em Paris um tratado sobre reformas da educação — tema de actualidade naquele ano, como vimos atrás — a que deu o título de Cartas sobre a Educação da Mocidade. O homem que escrevia não estava em Portugal, de onde fugira aos 27 anos com medo da Inquisição, e aonde nunca mais voltara. Passou por Londres, onde se converteu brevemente ao judaísmo, religião dos seus antepassados. Foi para a Holanda, onde estudou medicina, e ficou racionalista para o resto da vida. Acabou na Rússia, onde foi médico da czarina Anna Ivanovna. Esteve na Crimeia, onde conviveu com muçulmanos e budistas. Passou pela Prússia a visitar Frederico II. E agora está em Paris, onde tenta sobreviver sem pensão até que Catarina a Grande se lembrará dele e o deixará confortável em rublos até ao fim da vida.
O seu nome é António Ribeiro Sanches e nasceu em Penamacor há 60 anos, em 1699. Tem por isso — como Sebastião José de Carvalho e Melo, agora Conde de Oeiras — quase a idade daquele século XVIII a que tantos consideram “das Luzes”. E apesar de viver há tantos anos longe de Portugal, onde aliás nunca voltará (morrerá em 1783, com 84 anos, poucos meses depois de Sebastião José de Carvalho e Melo, então já conhecido como Marquês de Pombal), a sua grande questão continua a ser Portugal. E a grande questão de Portugal na mente dele continua a ser o que fazer com este país. Que estratégia deve Portugal seguir: mão-de-obra barata ou valor acrescentado?
Pode parecer por isso estranho que num tratado sobre educação Ribeiro Sanches dedique uma grande parte da sua secção final à escravatura. Mas faz todo o sentido que o tenha feito, por uma razão simples. Porque a escravatura é desumana para os escravos, é o seu ponto de partida. Mas no que diz respeito à educação, há ainda outro problema para Ribeiro Sanches: é que a escravatura estupidifica os donos dos escravos.
Esta é a quinta conversa da nossa quarta memória, dedicada à emancipação.
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