Há tinta permanente na Internet: dicas para pais e professores
Talvez este momento de isolamento social, seja, curiosamente, o mesmo momento de constatação que o digital é aquele que une.
O 3.º período já se iniciou, não com aulas presenciais, mas num modelo para o qual ainda se procura nome, tal a multiplicidade de formatos e variáveis. Quer seja mais um Ensino a Distância de Emergência, um Ensino Remoto ou até um Ensino Doméstico, a sociedade e a opinião pública já o definiu, como Ensino a Distância!
É este o contexto que deixa pais e professores submersos em preocupações, que afectam as suas vidas e, principalmente, a dos seus filhos ou alunos.
É fundamental manter nas crianças um sentido de normalidade com rotinas, mantê-las envolvidas na aprendizagem em casa, sabendo que uma “escola” parca e pouco fluida em desenhos e cenários de aprendizagem com o digital é a que está esboçada num cavalete pouco seguro, até ao final do ano lectivo.
Além disso, é importante lembrar que, para uma criança, o brincar sempre foi e é uma excelente forma de aprender. Porém, a “escola” presencial e a distância, teima em não introduzir e, em muitos casos, retirar a ludicidade da Educação. O tempo para brincar, aprender a brincar e brincar a aprender é algo de muito sério, não deveria ser relativizado, enquanto apenas o que se discute, essencialmente, são testes e exames, o que mais se discute são avaliações de resultados e na realidade vamos deixando de discutir os processos (alguma vez se discutiram?)… E este é um tempo em que a avaliação de processos deve e tem de ser pensada numa discussão séria.
Em casa, os pais tentam assegurar que a aprendizagem acontece nas melhores condições possíveis, que decorrem actividades para o entretenimento e para, no fundo, coabitarem. Assim, existem alguns aspectos ou sugestões que podem ajudar.
Manter uma rotina é, absolutamente, essencial e como tal poderá ser criada uma programação diária com os filhos, que pode incluir as actividades relacionadas com matemática do quotidiano, com a leitura, ciências experimentais, entre várias actividades que se podem interligar com disciplinas escolares.
Mas é, sobretudo, no plano de outras actividades, que podem e devem ser da escolha dos filhos, rotativas nos dias ou nas semanas, como o desenho, a colagem, a pintura, a dramatização, o faz de conta, a construção, a culinária, exercício físico, tarefas domésticas, o canto ou a dança, entre tantas outras… Este plano não tem que estar controlado como um horário escolar e ao som do toque de uma campainha, mas é um apoio e, se for desenhado em família, responsabiliza cada um dos membros da mesma, criando objectivos e actividades comuns.
Este plano torna-se ainda mais importante à medida que recebem os cronogramas excessivos, de aulas online síncronas que as escolas programaram, a grelha da RTP Memória ou as tarefas assíncronas de imensos trabalhos para os alunos realizarem com o apoio dos pais. Nessa altura, cada casa e família assemelham-se a um departamento curricular a lutar pelos seus horários e fazer valer as tarefas que têm maior ou menor valorização… que haja, o bom senso, de nesse mapa manter sempre espaço livre para não se fazer absolutamente nada.
Se os seus filhos forem mais velhos, converse honestamente com eles sobre o seu cronograma, mostre a sua disponibilidade para estar com eles, podendo estabelecer um sistema de créditos, em que determinadas tarefas ganham créditos para a realização de outras.
As notícias são também muito importantes, mas com os filhos, se por um lado devem inspirar a sua leitura e interpretação, por outro devem limitar as diversas notícias assustadoras que lhes trazem apenas pânico e ansiedade (principalmente nas crianças mais pequenas). Lembrem os filhos que estarão sempre seguros, cumprindo todas as normas de segurança e questionando sobre como se sentem. Muitas das vezes, por que não provocar actividades de desenho ou de escrita sobre este tema, com diários de quarentena em texto, desenho ou fotografia, dão excelentes portefólios que poderiam ser aferidos em processos de aprendizagem e reflexão.
Embora saibamos que este é um tempo de incertezas, também o é de algumas certezas e, para quem está com os seus filhos, num regime alucinante de teletrabalho, em que se tornam actores de multitarefas, lembrem-se que é um tempo e oportunidade de “estar” em família.
Em nenhum momento deste século, tantos pais e mães tiveram a oportunidade de acompanhar de forma detalhada como os filhos estão a crescer, a progredir e do que estão a precisar. Conseguem, neste tempo, ter mais informações para estabelecer uma melhor parceria, também esta, com os professores e apoiar estes alunos de uma forma bem mais holística. Façam jogos, revejam fotografias, escrevam histórias a várias mãos, inventem letras e músicas, preparem refeições em conjunto, aprendam a divertir-se.
Também é evidente que muitos estão a ter dois ou mais empregos integrais, e todos com o mesmo horário em simultâneo, pelo que é necessário admitir erros e permitir o espaço para que estes aconteçam. Nesta nova ambientação é preciso reservar intervalos com maior frequência, de forma a brincar com os seus filhos ou fazer um lanche mais divertido, mas também a quebrar os ciclos em frente aos inúmeros ecrãs que, por serem mais frequentes, exigem mais pausas.
Enquanto pais, com filhos que estudam em casa, devem salvaguardar, neste 3.º período, a organização do estudo, considerando os roteiros enviados pela escola, assim como o cumprimento de tarefas e de prazos para as mesmas. Também o espaço onde decorrerão as diversas actividades de estudo, sejam estas síncronas ou assíncronas, deve ser redefinido, considerando um local com boa luz natural e, se estiver a trabalhar com dispositivos digitais, que seja onde o aluno esteja bem visível na câmara web, evitando a contraluz, objectos e cenários distractivos, mas também que o áudio seja perceptível para todos, evitando ecos, passagem de outras pessoas e, se possível, o uso de auriculares.
Ora, é exactamente este o momento em que os pais, professores, filhos e alunos deste país se encontram mais expostos ao fenómeno da Internet. Talvez este momento de isolamento social, seja, curiosamente, o mesmo momento de constatação que o digital, já apontado por muitos pais e professores, como elemento que distancia e afasta as pessoas, é agora aquele que as une.
Mas, porque o 3.º período começou, não podemos esquecer, e para muitos convém lembrar, que estamos online com menores de idade e há cuidados e erros que se tornarão irreversíveis, ou não estejamos nós a fazer todos os registos na Internet, com tinta permanente, que nunca mais se apagam!
Como tal, existem alguns cuidados relacionados com a segurança online que pais, professores, filhos e alunos têm de ter consciência, sob pena de se cometerem erros irreversíveis.
Se numa saída à rua, enquanto passeava pelo jardim surgisse um estranho a interpelar o vosso filho ou aluno e lhe perguntasse o nome, a morada, com quem mora, quem são os amigos, pedindo se lhe fornece os contactos dos mesmos, quais os lugares preferidos que frequenta, os objectos que tem, que livros lê, o número de cartão de cidadão, o número de telemóvel… responderia? Possivelmente, não! Aliás, acharia aquele número de questões avassalador e fugiria. Ainda assim, muitos estranhos oferecem algo em troca, um chocolate, talvez! Aceitaria? Possivelmente, não! Nem todos os estranhos abordam, outros estão apenas à espreita, a vigiar todas as conversas e partilhas.
Se num ambiente presencial, a atitude de desconfiança seria a primeira a adoptar, porque é que num ambiente online partilham um conjunto de informações privadas, quando muitas das questões não são directas, mas subliminares e, assustadoramente, ou não, nem as precisam de fazer, porque as respostas são oferecidas nas publicações que fazem?
Se pensarmos que estão a decorrer aulas online, com vídeos e imagens de menores a exporem a sua casa, a sua vida, o seu pensamento, os seus bens, a sua intimidade enquanto cidadão, que privacidade está desenhada para estes cenários de estudo em casa? E os pais, quantas publicações de fotografias dos seus filhos menores a realizarem um sem número de actividades e aulas, também estão a expor, sem que estes tenham tido qualquer papel decisivo na pegada digital que lhes estão a criar?
Reitero, que neste 3.º período, assuma sempre que na Internet não existe segurança e privacidade absoluta e considere as seguintes dicas:
- Ter bom senso na postura online: o que publicar, prever cenários, prever perigos, prever monitorização, comunicar com respeito.
- Não partilhar fotografias ou vídeos pessoais e com informações privadas (se o fizer tem de ter critério, evitar imagens dos seus filhos menores, as situações de constrangimento, locais, objectos e vestuário que os identifica).
- Não partilhar informações seguras num chat, como as passwords ou outras informações pessoais.
- Nunca clicar em links que não conhece (não há ofertas gratuitas).
- Ter atenção que muitos registos em aplicações e jogos online são formas de “entrar” no seu computador para obter informações.
- Terminar as sessões nas plataformas educativas ou e-mails usados.
- Usar a navegação anónima para controlar a pegada digital.
- Nesta fase, ter uma atenção redobrada com as compras online.
- Evitar abrir links de redes sociais (como correntes, postais).
- Ter o cuidado de perceber com quem conversa online, garantindo que está com quem o diz ser.
- Usar as configurações de privacidade das redes sociais.
- Respeitar os direitos de autor do que partilha.
- Referenciar as consultas de informação online (website, autor e data de onde retirou a informação).
- Definir uma “Netiqueta” online com o seu filho ou aluno.
Acima de tudo, sejam pais ou professores, dêem o exemplo aos vossos filhos ou alunos, logo a começar nas diversas videoconferências que decorrem e todos vos estão a entrar em casa, pela janela do computador. Será que permitiriam que olhassem tudo o que estão a mostrar? Têm a consciência que qualquer conteúdo (fotografia ou vídeo) que gravam e publicam dos vossos filhos ou que exigem aos vossos alunos será exposição em demasia, sem que vos tenham autorizado a isso? Tenham bom senso na partilha de privacidade e suspeitem de pessoas ou instituições. Se têm cuidado e se se protegem na rua, porque não o fazem virtualmente?
O que faz e escreve na Internet nunca será a lápis (embora alguns julguem que sim), é sempre com tinta permanente, nunca mais se apaga!