Aulas online, exames incertos, um Verão diferente. Como é acabar o secundário em tempo de covid-19?
Primeiro viram bailes e viagens de finalistas cancelados. Depois remeteram-nos para aulas online. E, agora, resta a incerteza sobre como vão concluir o ano lectivo. O P3 falou com cinco alunos de vários pontos do país, com 17 anos e a acabar o secundário, para perceber como têm vivido a crise do coronavírus.
“Já não vamos ter baile de finalistas, as viagens foram canceladas, eu fico com pena”, começa por dizer Catarina Gomes, aluna de Ciências Socioeconómicas na Escola Secundária de Penafiel. A desilusão é partilhada por Carolina Morganheira, estudante e Artes Visuais na Escola Secundária de Vendas Novas: “Aborreceu-me não poder viver com os meus amigos aqueles momentos que já estavam todos planeados para acontecer, foi tudo por água abaixo.” Com o decreto de estado de alerta, por parte do Governo, a 12 de Março, dada a pandemia do novo coronavírus, dissolveram-se os planos de festejo que marcam o fim da adolescência — e, com eles, também a noção de normalidade da conclusão do 12.º ano e consequente acesso ao ensino superior.
Afonso Almeida, também em Artes Visuais na Escola Secundária Diogo de Gouveia, em Beja, recorda: “Nos últimos dois, três dias de aulas presenciais só se falava disso, era todas as aulas a mesma conversa”. Afonso é um dos cinco jovens de 17 anos, a terminar o ensino secundário, com quem o P3 esteve à conversa. O fim desta etapa académica é, há já quase um mês, uma incógnita, que o Governo promete deslindar já esta quinta-feira, 9 de Abril: se as aulas prosseguirão em regime presencial ou online e se os exames nacionais se mantêm nas mesmas datas ou serão adiados ou descartados.
Carolina, Catarina e Sofia Domingues já tiveram aulas online e, até agora, a imagem que pintam não é a que desejavam. “Conseguir aceder à aula foi uma confusão, devo ter levado pelo menos meia hora para conseguir entrar e houve colegas que já só mesmo no final”, conta Carolina sobre o acesso à plataforma. Dificuldades que Catarina também sentiu: “Nem à segunda aula aparecemos a turma toda”.
Sofia Domingues, em Ciências e Tecnologias na Escola Secundária Júlio Dinis, em Ovar, acrescenta a impossibilidade de acompanhamento presencial às frustrações, mas aplaude os professores, que se adaptaram, trocando testes por entregas de trabalhos com prazo: “Tenho visto compreensão e acessibilidade da parte deles todos, nas notas não fomos prejudicados.”
Regressar às escolas, longe ou perto do coronavírus
António Costa pode ter deixado claro que, até Maio, as aulas presenciais eram uma miragem, mas mesmo numa zona onde não há casos confirmados de covid-19, como na ilha de Santa Maria, nos Açores, voltar à escola levanta dúvidas. “Pessoalmente, preferia continuar as aulas online, ainda que, pelo menos cá, ter aulas presenciais seja uma opção”, reflecte Nuno Barbosa, que estuda Línguas e Humanidades na Escola Básica e Secundária Bento Rodrigues. Todavia, Nuno aponta: “Tenho alguns colegas que não têm acesso a computadores e internet e a escola não tem equipamento suficiente para apoiar todos os alunos.”
Noutras paragens, talvez seja mesmo imperativo prosseguir com as aulas via digital, como aponta Sofia, que não vê “as pessoas ficarem à vontade” em Ovar, onde foi declarado estado de calamidade pública. Até opções de distanciamento entre alunos, quer espacial quer horário, lhe parecem inviáveis numa escola em obras, com instalações interditas e salas pequenas: “Temos turmas com uns 30 alunos em que já antes tínhamos de ir buscar cadeiras para levar para a sala.”
A interrupção brusca das aulas presenciais causou-lhe outra celeuma: transferida em Janeiro de uma escola onde estava implementado um projecto-piloto de autonomia e flexibilidade curricular, vê-se agora apanhada numa dualidade. Para os seus actuais colegas, Educação Física continua sem contar para a média de acesso ao ensino superior; para ela, vinda de uma escola-piloto, a nota desta disciplina foi contabilizada no 11.º ano. A informação só lhe foi veiculada na semana antes do encerramento da escola e Sofia não estava à espera de se ver em pé de desigualdade: “São directrizes que prejudicam o meu acesso ao ensino superior”. Nos dias que lhe restaram antes de encerrados os estabelecimentos de ensino, contactou com a secretaria da escola, director de turma e Provedoria da Justiça, tudo para tentar solucionar a questão. “Mas não posso estar a sobrevalorizar o meu problema em relação ao da maioria, a pandemia”, admite. “Estamos numa fase em que respostas não podem ser dadas.”
A incógnita dos exames nacionais
“Tenho continuado a estudar matéria que sai nos exames e estou aqui à espera de novidades”, desabafa Nuno. Todos os cinco alunos o têm feito: uns elencam o apoio que têm sido as explicações, também estas via online; outros, obstáculos como a impossibilidade, nesta altura, de frequentar espaços como bibliotecas, que seriam território de sossego face às casas cheias onde fazem quarentena.
Nem todos consideram que beneficiariam dos exames nacionais, no que à média final diz respeito. Contudo, todos concordam que as provas são imperiosas, num sistema de notas internas desiguais. “Não haver exames ia ser ingrato para uns e benéfico para outros; o receio pelas médias de acesso já o temos de qualquer das formas, por isso é mais justo todos passarmos pelo mesmo”, elabora Catarina.
O Verão, na hipótese de ser prolongado o estado de emergência e adiados os exames, será atípico. “Pela primeira vez eu tinha planos, ia fazer uma viagem, tinha planeado trabalhar e talvez vá ter que cancelar”, lamenta Afonso, que também teme restrições na circulação aérea, dado que espera vir a ser admitido em Design de Moda no Reino Unido.
Já Nuno, que quer ir estudar Gestão de Marketing para Portugal Continental, ainda não ponderou sobre essa possibilidade. Catarina, face a qualquer reagendamento, quer entrar em Gestão, no Porto. Carolina não está preocupada, pelo menos até Setembro: “Ainda não decidi para que área vou; por isso, quanto mais tempo tiver, melhor para mim”.
É uma liberdade de espírito da qual Sofia, que quer seguir Medicina, também partilha: “Se adiassem os exames eu ficava contente, dava-me mais tempo para estudar”. As férias, que prometiam ser as últimas antes das responsabilidades da vida adulta, podem não vir a ser o que esperavam, admitem. “Mas o ensino secundário são três anos que [nos] podem prejudicar para sempre, se não nos correr bem. Verões vamos ter muitos.”