É evidente que os próximos tempos vão ser duros, muito duros para o nosso país. Num momento em que a pandemia se alastra e que os números em Portugal continuam a subir, obrigando a uma paralisação parcial do país, é imperativo que não se olvide os problemas daqueles que, não tendo já uma vida fácil antes da covid-19, passarão por tempos extraordinariamente penosos quando a pandemia se for embora. Falo dos trabalhadores precários do meu país, dos que têm vínculos laborais frágeis ou quase inexistentes. São muitos os trabalhadores que, na falta de segurança e estabilidade no trabalho em tempos de normalidade, são lançados na incerteza neste tempo de excepção.
São já muitos os relatos de despedimentos de trabalhadores, por exemplo, na vigência do período experimental, aumentado para seis meses na última reforma laboral levada a cabo pelo PS. Se levantavam bandeiras de um progresso no combate à precariedade com esta reforma, atentem agora quem são os primeiros a cair. Adiante. São muitos os contratos a prazo que já não vão ser renovados ao mesmo tempo que o presidente da CIP - Confederação Empresarial de Portugal clama por mais crédito para as empresas, por mais apoios para os patrões, incita até aos seus associados a despedirem trabalhadores como resposta às medidas do Governo. O sector automóvel está em stand by e não descarta a possibilidade de ter de despedir trabalhadores, bem como muitas indústrias que recebem de frente o embate desta crise. Os comércios e serviços e os seus trabalhadores vão para casa em regime de lay off simplificado ou são obrigados a tirar férias durante este período.
Mas sejamos claros: se uma crise económica irrompe, e sabemos que pode muito bem acontecer, não podem ser, mais uma vez, os trabalhadores a pagar a crise. Não podem ser sempre os mesmos.
Quando na sexta-feira esperávamos que o primeiro-ministro anunciasse medidas de apoio aos trabalhadores e suas famílias, ouvimos o anúncio do reforço das linhas de crédito para as empresas, apoios à produção e pouco mais. Bem sei que é essencial que as empresas tenham a liquidez necessária para continuarem a laborar e que são essenciais para a manutenção dos postos de trabalho. Contudo, esta crise não pode ser motivo para dar passos atrás nas conquistas que os trabalhadores têm alcançado nos últimos anos. Ouviremos falar, certamente, na necessidade de descer os salários, flexibilizar ainda mais os despedimentos e as formas precárias de empregar, ouviremos vozes a clamar pela descida do salário mínimo e a supressão de determinados direitos laborais. Neste tempo em que os direitos à greve e à manifestação estão suprimidos é essencial que não larguemos os trabalhadores da mão porque são eles a grande força produtiva e essencial da economia deste país. São o elo mais fraco das relações laborais e os primeiros a sofrer a baixa de rendimentos tão imprescindíveis neste tempo de aflição.
É precisamente neste momento que o Governo devia garantir que nada falte nas casas dos trabalhadores, que os rendimentos não baixam e que os despedimentos não disparem com o pretexto nesta pandemia. Os despedimentos deviam ser, neste tempo, proibido, as contas da luz e da água deviam ser asseguradas para que a seguir a esta pandemia não assistamos ao degradar das condições de vida de grande parte da população portuguesa. A crise económica também mata e a experiência recente por que passamos devia suscitar-nos vigilância pelos nossos postos de trabalho e pelo nosso salário.
Já pagámos uma crise inteira ao sector bancário, pois que sejam os bancos a pagar a crise de hoje, aquela que poderá ser a maior das nossas vidas.