A juventude é o nosso ouro e o desporto um dos instrumentos vitais da sua valorização
Investir no desporto é investir no ouro da população portuguesa. As iniciativas do Presidente têm os pés de barro do actual Modelo do Desporto Português.
Por analogia com o petróleo verde do eucalipto em que Portugal investe e chega a empobrecer-se, a juventude é o ouro desperdiçado pelas políticas públicas do desporto.
O Presidente da República tem iniciativas em prol da juventude e do desporto. É um hábito antigo do político que se posiciona no desporto com substância, sobressaindo da opinião corrente. As federações terão, na actual Presidência, a personalidade capaz de acompanhar as ambições legítimas do desporto.
A iniciativa presidencial carece de cão (os feitos nas competições de primeira grandeza, a presença efectiva do desporto na sociedade e uma Visão do Século XXI desportivo) e, por isso, caça com gato (os campeões actuais e os maiores do passado). A iniciativa recente que promove encontros entre a juventude e os campeões complementa as medalhas honoríficas que agraciam personalidades do desporto nacional. Subsiste o problema de usar todos os campeões agora no 1.º mandato e, no 2.º mandato, usá-los de novo, porque o Modelo de Desporto Português é incapaz de os renovar e de se afirmar socialmente.
Na busca do melhor negócio, Portugal empurra as responsabilidades públicas com a barriga até ao desaire. Aconteceu nas florestas, bancos, rios, hospitais, comboios e acontece no desporto com impactos negativos na saúde, produtividade, competitividade e bem-estar da população. Quanto desporto e cultura faltarão na vida e na morte das mulheres pelos seus companheiros? Quanto desporto falta ao combate às doenças que se curariam com estilos de vida activos através do desporto? Quantas vidas o país perde por essas mortes e doenças evitáveis? Quantos milhões de euros têm as Finanças de dar à saúde e à segurança social para manter o bem-estar de vida dos carenciados devido às insuficiências da prática desportiva? Quantos milhões de euros a Economia perde pela carência de produtividade e de competitividade dos estudantes e da população activa, devido aos seus baixos níveis de prática desportiva? Etc...
A liderança da política desportiva é um erro, tem disparates e erros e há medo em falar!
O desporto português necessita de um mercado democrático e competente de princípios, conceitos, ideias, contradições, rasgo e risco que funcione efectivamente para além dos governos e das organizações desportivas. Geralmente começam-se as conversas elogiando e dizendo que se é amigo do líder e, pouco a pouco, caem os pecados. A crítica democrática e frontal usando estatísticas e factos está banida do desporto, tal como da sociedade, levando-se de onde menos se esperaria.
O mercado do desporto faliu. Há desafios simples e outros complexos. Vejam-se cinco exemplos.
1. Com Mirandela da Costa, que liderou a administração pública desportiva, e com Luís Santos e José Castel-Branco, que lideraram a criação da Confederação do Desporto nos anos 90, o desporto como um todo fazia-se ouvir e era ouvido pela sociedade portuguesa. Depois perdeu-se essa capacidade desportiva de presença nacional.
2. Lisboa tem um think-tank de ética com um trabalho relevante no debate de projectos desportivos valiosos e deveria debater as opções de futuro do desporto nacional. Atentem-se três dimensões: para a presente legislatura, o PS propôs colocar a prática desportiva dos portugueses entre os 15 primeiros países da Europa, o PCP sugeriu alterar as orgânicas públicas e privadas do desporto e o PSD indicou a criação do plano e de um programa de desenvolvimento e o incremento do financiamento; antes, em 2018, o Papa Francisco publicou a posição da Igreja Católica sobre o desporto, chamada Dar o melhor de si; e, em 2017, um conjunto de federações desportivas concebeu a Plataforma do Desporto Federado. Esta iniciativa associativa terá sido rejeitada por uma das direcções eleita pelas mesmas federações. Será que estas iniciativas de política desportiva pública serão discutidas publicamente?
3. Em 2013 foram nomeadas por uma organização desportiva dezenas de pessoas que, segundo se afirmou, se consideravam ser as melhores. Hoje parece que nenhuma dessas pessoas se distinguiu pela nomeação. Desconhecem-se textos ou factos que associem esses melhores a realizações notáveis no desporto português. Esses melhores são desconhecidos, ou foram esquecidos por terem sido levados na água do banho da organização que os alardeou? Para além desta realidade, e com excepções pontuais, verifica-se que os resultados desportivos se mantêm pouco distintos dos do passado, não se percebendo o contributo dos melhores. Melhores para quê? Melhores em quê? Competência, erudição, amizade, ideologia, partidarismo, capacidade (a)crítica, moda, fait-divers, sound bytes…? Em lugares próprios cada uma terá a sua legitimidade, bastando e devendo afirmar-se com clareza a responsabilidade procurada.
4. Numa licenciatura em desporto na Universidade Lusíada de Lisboa foi perguntado a um aluno que joga em selecções nacionais de râguebi quem foi Raul Martins. “Não sei!” Foi a resposta pronta. Acrescentaram-se outros elementos: foi jogador e capitão das equipas do Técnico, fez parte de selecções nacionais de que foi capitão, foi presidente da Federação de Rugby é líder da cadeia de hotéis Altis. O aluno manteve o desconhecimento, acrescentando que não tinha de saber, o que se concorda, lacto senso. “Então e o pai Fernando Martins, que foi presidente do Sport Lisboa e Benfica de 1981 a 1987, já conheces?” “Sim, conheço!”, disse o aluno. Acrescente-se que na geração de praticantes de râguebi de Raul Martins se encontram Pedro Lynce, Vasco Lynce, José Gaspar Ramos, António Vieira de Almeida, Manuel Castro Pereira, Pedro Ribeiro, Vasco Pinto de Magalhães, com currículos igualmente de excepção.
A matéria relevante da pergunta é que a prática desportiva gera benefícios adicionais, diferenciados e cumulativos para o praticante e para terceiros, não só no curto mas, também, no médio e no longo prazo. A relevância da prática de qualidade é por vezes imperceptível à política desportiva nacional. De um grupo de jovens que ganha o campeonato do seu escalão etário, o que interessará ao empresário Jorge Mendes será o talento precoce de um dos atletas com os quais ganhará euros em contratos entre os clubes onde jogará o talento. Ao decisor público e ao associativo interessará o facto de o grupo constituir um todo com um potencial desportivo, escolar e social acima da média. Eventualmente, como acontece nos bons Modelos de Desporto, alguns anos depois, desse grupo poderão sair vários campeões, que serão cidadãos notáveis, e o valor económico e social associado ao grupo será superior ao do talento, por extraordinário que seja. Encontram-se exemplos no râguebi português.
5. Uma das particularidades inaceitáveis da administração pública no desporto é que desde o topo da pirâmide até ao seu sopé se prefere o simplismo das selfies segundo uma decisão, a que se chama pública e desportiva. Alguém tem de trabalhar e responsabilizar-se por políticas que resultarão a prazo e não no resultado da legislatura salvífica através de actos políticos instantâneos de si próprios.
Ou seja, os encontros entre campeões e jovens, proporcionados pela Presidência da República, exigem políticas públicas que são complexas e devem ser promovidas a montante pelo Estado, ao longo dos ciclos olímpicos e dos ciclos legislativos a nível nacional e contando com consensos entre os parceiros políticos e desportivos. Esse é o sentido das propostas de Pactos de Regime e que as federações desportivas recearão exigir aos partidos nesta legislatura.
Investir no desporto é investir no ouro da população portuguesa. As iniciativas do Presidente têm os pés de barro do actual Modelo do Desporto Português.