A crise de representação
Este é o momento de todos os protagonistas em Portugal aproveitarem esta “crise” e ajudar a mudar os paradigmas de comunicação, representação e de formas de participação política para o futuro.
Em períodos excepcionais, a política ultrapassa a esfera da gestão dos assuntos públicos e alarga as próprias fronteiras para o espaço de intervenção partidária na própria democracia, enquanto sistema.
O tacticismo e o convencional têm transformado o paradigma da política ao longo dos tempos, pelos piores motivos, e isso revela-se com o crescente afastamento dos eleitores. Assistimos, em Portugal e na Europa, a uma degradação da democracia representativa e a sociedade portuguesa reage com uma omissão cívica preocupante.
Nestes novos tempos, a todo o momento, a palavra “crise” surge nas discussões políticas quando ouvimos falar em crise económica, crise social, crise diplomática, crise de valores, crise de liderança, crise de regime e agora a mais preocupante de todas, a crise de representação.
A política e as crises tornaram-se realidades inseparáveis ao ponto de poder dizer-se que uma pressupõe a outra. Sem crises, num mundo perfeito, a política seria quase dispensável. Mas quando falamos de crise de representação abre-se um novo tempo negro, em que não temos noção das consequências futuras.
Hoje vivemos claramente uma crise de representação e o maior exemplo disso foram os cerca de 70% de abstenção nas últimas eleições europeias. Só 3 em cada 10 portugueses foram votar e não parece que apenas 30% de uma população possa representar os demais 70% alheados.
No momento atual em que, sem que muitos o percebam, vivemos a crise da própria política, temos inevitavelmente de adotar uma estratégia capaz de reanimar, no curto prazo, uma democracia que parece estar, ela sim, condenada á irrelevância.
Têm de se restruturar os partidos políticos na sua estrutura, funcionamento, organização e nas formas como comunicam com o eleitorado.
Têm de ser combatidos os vícios do sistema parlamentar definindo critérios objetivos para a ação política, para a participação política e até para a eleição e nomeação para cargos públicos.
Têm de se derrubar as barreiras do sistema político atual onde predomina a desresponsabilização dos seus protagonistas e ausência de fiscalização dos eleitos pelos eleitores.
Têm de ser enfrentados os interesses mais ou menos instalados na administração publica, nos órgãos de poder, nos grupos de pressão e nos grupos de interesses particulares (sindicatos, Associações, Ordens Profissionais, etc.).
Mas temos também de aproveitar o momento para refletir, com os protagonistas da opinião publicada e com a comunicação social em geral, sobre a sua responsabilidade neste estado de coisas. Não pode a comunicação social - o 4.º Poder - assobiar e olhar para o lado como se, também ela, não tivesse responsabilidades no estado da arte.
Este é o momento de todos os protagonistas em Portugal aproveitarem esta “crise” e ajudar a mudar os paradigmas de comunicação, representação e de formas de participação política para o futuro.
Mecanismos de participação política tradicionais como por exemplo a petição, a representação, a reclamação e a queixa, pelos poucos resultados que produzem estão completamente obsoletos e são ineficazes nos novos tempos.
Este é momento de colocar a debate as ideias mais disruptivas e ousadas (dentro de critérios de responsabilidade) para poder mudar o futuro da democracia participativa e assim aproximar os cidadãos da política.
Como disse Winston Churchill: “Nunca devemos desperdiçar uma boa crise.” E Churchill sabia muito bem como as enfrentar e potenciar. Temos de o fazer e não embarcar na demagogia fácil de quem não quer mudar nada.
É urgente encontrar consensos alargados que promovam uma reforma eleitoral e política com os olhos postos nos interesses das pessoas. Mas mais ainda é preciso encontrar consensos alargados para as reformas estruturais de um País em que a democracia participativa é elemento vital.
Hoje o vínculo entre os cidadãos e os políticos tem vindo a dar lugar a uma crescente indiferença, desconfiança e afastamento e é exatamente este vínculo de confiança que temos de ver reforçado, sob pena de termos repetidamente 30% de opiniões a comandarem 100% de portugueses.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico