A mesa da ministra da Saúde
Lamento que se perpetue uma visão de austeridade na Saúde. Os doentes merecem muito melhor.
O Dia do Doente, a 11 de fevereiro, deveria ter sido uma excelente oportunidade para uma reflexão alargada sobre o tema: o papel do doente nos cuidados de saúde, a preservação da relação preciosa entre os profissionais de saúde e os doentes e a humanização (ou desumanização) dos cuidados de saúde.
Ao invés, foi uma semana para esquecer. Entre troca de argumentos entre o Ministério da Saúde e os enfermeiros numa greve cirúrgica sem fim à vista, o anúncio da rescisão unilateral dos contratos com a ADSE por parte de grandes grupos económicos do setor, o doente teve muito pouco espaço para fazer parte de uma reflexão profunda e serena.
A Ordem dos Médicos assinalou esse dia com debates sobre o tema e a divulgação dos “Tempos Padrão para as consultas médicas”.
Este documento, colocado em discussão pública, é dos instrumentos mais importantes publicados nestes últimos anos com o objetivo de defender os doentes e preservar a qualidade dos atos praticados. Trata-se de um contributo inestimável que defende os doentes, não só como garantia da prática de cuidados de saúde adequados, mas, também, como uma iniciativa que visa travar a desumanização crescente no Serviço Nacional de Saúde.
O trabalho, elaborado com os contributos de todos os Colégios de especialidades médicas, define os tempos médios para cada tipologia de consulta, dependendo da especialidade em causa. Consoante a sua complexidade, uma consulta pode variar de 15 minutos até 1h30 em caso de prática de atos médicos mais complexos.
Na Cirurgia Geral, por exemplo, uma consulta poderá ter um tempo padrão de 30 minutos; de 40 a 60 na Medicina Interna, de 15 a 45 minutos no caso de consultas com o Médico de Família.
Finalmente, e pela primeira vez, existe uma definição técnica da duração de uma consulta e não meras definições administrativas que nunca fizeram sentido no âmbito da prestação de cuidados.
Estes tempos representam uma necessidade real para uma consulta médica adequada e que salvaguarde uma boa prática médica e respeite o doente.
A ministra da Saúde apressou-se a desvalorizar o documento, defendendo que esta proposta não estaria inscrita no Orçamento do Estado. “Não está em cima da mesa” foi a sua claríssima mensagem: a seu ver, importante são os números. A qualidade e o bem-estar dos doentes terão de ficar para “outras núpcias”...
Não podemos permitir qualquer concessão. A visão redutora de encaixar a Saúde em fórmulas contabilísticas, desprovidas de qualquer sensibilidade para a melhoria dos cuidados de saúde, já demonstrou ser desapropriada.
Lamento que se perpetue uma visão de austeridade na Saúde. Os doentes merecem muito melhor.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico