Para já, o "plano B" de May é continuar a ouvir os partidos e levar as conclusões a Bruxelas
Primeira-ministra britânica regressou ao Parlamento para apresentar uma alternativa ao acordo de saída da UE chumbado na semana passada. Comprometeu-se a dar mais voz ao Parlamento, revogou a taxa aplicada aos europeus que quisessem permanecer no Reino Unido depois do "Brexit" e não abdicou das suas "linhas vermelhas".
Depois do contundente chumbo no Parlamento, na semana passada, do acordo para uma saída ordenada do Reino Unido da Unuão Europeia que negociou com Bruxelas, Theresa May viu-se obrigada a regressar à Câmara dos Comuns para afirmar que “ficou claro que a abordagem do Governo tinha de mudar”. “E mudou”, garantiu, no dia em que deveria apresentar uma alternativa ao seu plano fracassado para o "Brexit". No entanto, daí saiu pouca matéria para os negociadores trabalharem e o impasse mantém-se.
A primeira-ministra apresentou apenas as linhas-gerais do que será a sua estratégia daqui para a frente: não vai pôr de lado o cenário de um “Brexit” sem acordo; não quer nem um segundo referendo nem um adiamento da aplicação do artigo 50.º; quer dar mais voz ao Parlamento nas negociações com a UE; quer levar a Bruxelas as preocupações dos deputados sobre o chamado “backstop” para evitar a reposição da fronteira entre a Irlanda e a Irlanda do Norte; e quer ainda revogar a taxa aplicada aos cidadãos europeus que queiram permanecer no Reino Unido depois do “Brexit”.
Essa acabou por ser a única medida palpável e concreta do seu aguardado discurso, que em vez de desfazer as dúvidas apenas veio alimentar a incerteza. Mas a revogação da taxa de 65 libras (cerca de 73 euros) aplicada aos cidadãos da UE que queiram regularizar o seu estatuto de residente no Reino Unido após o "Brexit" foi vista como uma concessão -- à oposição e também a Bruxelas -- e não como uma solução.
As restantes propostas levaram a que a oposição em bloco, e especialmente Jeremy Corbyn, o líder do Partido Trabalhista que recusou reunir-se com May enquanto esta não descartasse categoricamente a possibilidade do no deal, defendesse que nada mudou na posição do Governo relativamente aos termos da saída da UE. Corbyn classificou os encontros da primeira-ministra com os restantes partidos como uma “farsa”.
“É responsabilidade do Governo negociar, mas também é minha responsabilidade ouvir toda a gente”, disse May, comprometendo-se a informar os deputados de todos os partidos sobre o andamento das negociações com Bruxelas. O único problema deste raciocínio da líder conservadora britânica é que os seus interlocutores do lado europeu insistem que as negociações estão fechadas: "Passámos 18 meses numa negociação complexa e difícil que resultou num acordo detalhado para a saída do Reino Unido que já todos dissemos que não está aberto a renegociação", repetiu o vice primeiro-ministro irlandês, Simon Coveney, que esta segunda-feira esteve reunido em Bruxelas com o negociador da UE para o "Brexit", Michel Barnier, e com os restantes ministros dos Negócios Estrangeiros europeus.
Sobre o chamado "backstop", o mecanismo de salvaguarda inserido no acordo de saída para assegurar que não voltará a haver uma fronteira física a separar as duas Irlandas, que é o centro de todas as discórdias no Parlamento britânico, May disse apenas que vai "considerar como se pode cumprir com as obrigações do povo da Irlanda do Norte e da Irlanda de forma a conseguir o maior apoio possível da Câmara [dos Comuns], e depois levar essas conclusões de volta à UE".
Uma frase que explica pouco, mas que serviu para May desmentir as notícias avançadas pelos media britânicos sobre a intenção de Londres reabrir negociações com Belfast sobre o Acordo de Sexta-Feira Santa, que pôs fim a décadas de violência sectária na Irlanda do Norte. Em Bruxelas, o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Jeremy Hunt, afastou liminarmente essa hipótese. "O Reino Unido continua totalmente comprometido com o Acordo de Sexta-feira Santa e o processo de paz na Irlanda",garantiu.
O plano de Theresa May para resolver o imbróglio em torno do "backstop" será então ouvir as diferentes opiniões no Parlamento, especialmente a dos norte-irlandeses do Partido Unionista Democrático (DUP) que sustentam a sua maioria de Governo, de forma a tentar encontrar uma forma de aprovar um acordo em Westminster. "Seremos flexíveis e imaginativos", prometeu Hunt, que disse em Bruxelas que a primeira-ministra não poderia ignorar "as preocupações expressas pelos deputados" nem desistir de conquistar concessões aos negociadores europeus.
Em nome dos 27, Michel Barnier já se mostrou disponível para rever a posição da UE sobre os termos da relação futura entre os dois blocos após o "Brexit", mas apenas no caso de uma alteração das condições apresentadas pelo Reino Unido durante as negociações. Mas esta segunda-feira May mostrou-se mais uma vez irredutível nas suas “linhas vermelhas”: a primeira-ministra não tira de cima da mesa o cenário de um “Brexit” desgovernado e não quer sequer ouvir falar em segundo referendo ou em adiamento da aplicação do artigo 50.º, que atira o Reino Unido para fora da UE a 29 de Março.
Segundo explicou, a única forma de evitar um no deal é, precisamente, alcançar um acordo. "A outra forma é revogar o artigo 50.º, o que significa ficar na UE", acrescentou. A extensão do prazo de negociações não é uma solução, prosseguiu. "É muito improvável que a UE simplesmente concorde estender o artigo 50 sem um plano sobre como vamos aprovar um acordo".
Sem uma alternativa concreta ao acordo chumbado por 230 votos na semana passada – naquela que foi a maior derrota de um Governo em Westminster – Downing Street decidiu que a votação que estava marcada para dia 29 deste mês será apenas para as emendas que os deputados queiram acrescentar à moção final do Governo.
A votação ao “plano B”, que na prática não foi apresentado, não deverá acontecer antes de Fevereiro.