Acabar de vez com as propinas: um consenso fundamental
A Convenção Nacional do Ensino Superior, organizada pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), encerrou com o Presidente da República a convocar todos os agentes políticos e sociais para um pacto de regime: acabar de vez com as propinas.
Nos últimos meses, a proposta que o Bloco negociou para o Orçamento do Estado de 2019 revelou-se como um verdadeiro abanão na opinião pública, abandonando o estigma de uma bandeira de uma minoria social para se transformar numa medida estrutural e convergente. A descida das propinas, já em 2019, reabriu um debate que estava trancado no armário há mais de 20 anos. E por que razão se impõe a urgência da eliminação das propinas?
Segundo o último estudo produzido pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), “Estado da Educação 2017” [1], apenas o Reino Unido e a Irlanda do Norte praticam uma política de propinas mais alta do que a portuguesa [2]. Em contraponto, continuamos a ser um dos países onde o fosso entre o valor da propina e o financiamento de Ação Social Direta (bolsas de estudo) é mais elevado. O impacto direto e indireto destas políticas de saque fiscal às famílias com estudantes no ensino superior tem servido de travão para o aumento do número de diplomados. Segundo os números da OCDE, Portugal continua aquém das metas apontadas para 2030: ter 40% de diplomados entre os 30 e os 34 anos.
A Convenção Nacional do Ensino Superior, organizada pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), encerrou com o Presidente da República a convocar todos os agentes políticos e sociais para um pacto de regime: acabar de vez com as propinas. Não foi o único a acompanhar a luta contra as propinas: vários responsáveis do Governo como Pedro Nuno Santos, o próprio ministro que tutela a área Manuel Heitor, Alexandra Leitão, Miguel Cabrita o fizeram. Ao combate contra as propinas, é bem-vindo quem vier por bem.
O pacto de regime, agora convocado por Marcelo de Rebelo de Sousa, é como a pescada: antes de o ser já o era (ou melhor, deveria ter sido sempre). A Constituição da República Portuguesa, que, no seu artigo 74.º, defende a progressiva gratuitidade de todos os graus de ensino, é o maior pacto de regime e não tem sido respeitado. Atentemos ao que o Tribunal Constitucional deliberou, através da publicação do Acórdão 148/94, acerca da matéria: “Nesta matéria a situação que, presentemente, se verifica em Portugal é profundamente inequitativa, na medida em que introduz uma discriminação negativa nas despesas das famílias portuguesas com a educação, resultando num maior benefício para as famílias de mais altos rendimentos, e contraria, por essa forma, a justiça distributiva visada pelo sistema fiscal. Acresce, ainda, que se trata de um valor igual para todos os alunos, independentemente da sua situação económica, o que introduz um outro factor de injustiça, uma vez que no ensino superior os benefícios revertem em parte para os próprios alunos.” [3]
2019 tem de marcar o início da mudança no Ensino Superior. Estamos na cauda da Europa no que toca ao financiamento do sistema, nos custos imputados aos estudantes e suas famílias, na incapacidade de responder às desigualdades através de ação social e, consequentemente, no número de diplomados. Os próximos anos têm de dar continuidade à coragem que já demonstramos e garantir, pelo menos, a mesma redução do valor das propinas que o Bloco conseguiu no Orçamento do Estado para este ano, até alcançarmos esse pacto de regime: o fim das propinas no ensino superior.
[1] http://www.cnedu.pt/content/CNE_EE_2017.pdf
[2] Figura 6.2.23. Valor mais frequente das propinas (inclui taxas administrativas) no ensino superior (CITE 6), 2017/2018. Estudantes a tempo inteiro. Europa.
[3] https://dre.pt/application/conteudo/250665
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico