Agora que se aproxima não só o início do novo ano lectivo, altura em que muitos estudantes universitários irão estudar para longe de casa, mas também o mês em que muitas pessoas recomeçam a sua vida profissional, o tema da habitação volta a ser um dos mais pertinentes. Infelizmente, parece que já ninguém está muito preocupado em discuti-lo em Portugal. Dá a sensação de que o interesse pelo assunto se esgotou com meia dúzia de tiradas demagógicas e correspondentes respostas hipócritas do Bloco de Esquerda a propósito do caso Robles. Resumiu-se a questão a uma espécie de filme de sábado à tarde, uma trama desinteressante cujas consequências acabaram com a resolução do caso. Talvez o debate acerca das reais implicações deste assunto na vida das pessoas seja desprovido de interesse cinematográfico ou, por outras palavras, de interesse eleitoral.
A doença está diagnosticada. Basta uma pesquisa de dois minutos no Facebook para perceber que a procura de quartos está a crescer e a oferta, a pouca que há, é a preços exorbitantes. As rendas cobradas a estudantes aumentaram 4% no início de 2018, sendo um quarto, em média, 17 euros mais caro do que em 2017. Em Lisboa, um quarto custa 485 euros. Este problema não é exclusivo de Lisboa e Porto. Em Braga, por exemplo, uma cidade com uma universidade de qualidade e em clara expansão, o preço da habitação já atinge valores insuportáveis para um recém-licenciado ou um jovem – sozinho ou casal – no início da vida profissional.
A cura, essa, parece mais difícil de encontrar. Costuma dizer-se que o exemplo vem de cima e, neste caso, relembrar este adágio é pertinente, porque o Estado falha redondamente. Em Lisboa, para 27 mil estudantes que vêm de fora, há duas mil camas em residências públicas. Muito poucas, portanto. O Governo já anunciou um plano para a criação de alojamentos a preços acessíveis, mas não há data para que estes entrem no mercado, o que fará com que passe mais um ano sem se resolver o problema. Como já vem sendo hábito, a solução chegará quando o problema for incomportável.
Para além disso, soube-se quinta-feira que o Estado deixará de pagar IMI agravado por imóveis devolutos de que seja proprietário, embora os privados o façam. O interesse desta alteração está para lá da questão meramente fiscal. Porque é que o Estado não usa esses imóveis para criar habitação? Porque é que não faz como a Segurança Social e vende os imóveis para que possam ser postos no mercado? Isso seria uma política pública que aumentaria a oferta de habitação permanente e, por isso, como o mercado funciona segundo a lei da oferta e da procura, reduziria o preço. O problema é que quase todas as propostas públicas para o sector que nos têm sido dadas a conhecer têm como consequência mais provável a diminuição da oferta. Como alertou o Presidente da República aquando do veto da lei do direito de preferência dos arrendatários, as medidas pensadas tornam o investimento em habitação para arrendamento permanente mais arriscado e convidam os proprietários a não arrendar, o que, em vez de resolver o problema, só ajuda ao seu agravamento. Também não é com a lei do alojamento local que vamos lá porque esse diploma mantém o descontrolo em áreas residenciais mais procuradas por estudantes e jovens trabalhadores. Andou-se e não se saiu do sítio.
Há uma verdade que é inexorável: a procura vai continuar a aumentar. Temos é de contrariar o inconveniente. Se não queremos que o preço aumente com o aumento da procura, é obrigatório que a oferta cresça também.