Progressões: o direito-objetivo
No caso concreto do ensino superior resulta que não ser avaliado é mais vantajoso do que ser avaliado.
A questão das progressões remuneratórias tende a cair facilmente nas armadilhas do populismo. A narrativa simples que foi criada (com caricaturas várias) impede até perceber qual a razão e sentido da progressão.
Não é possível falar de progressões sem um sentido económico (o que vai além do financeiro – sendo que o impacto líquido da totalidade das progressões na Administração Pública representa menos de um décimo do buraco do BPN).
É preciso entender que as progressões pretendem implementar uma lógica de motivação (um reforço positivo), numa conceção da vida profissional que não assenta apenas no curto prazo (o bónus). Trata-se de uma lógica moderna que tem por base uma ideia simples: a melhoria do desempenho liga-se à melhoria do vencimento.
Essa pretensão de espiral positiva contrasta com espirais depreciativas baseadas unicamente na escassez de emprego.
A diferença entre estas espirais ajuda a perceber a diferença entre países com economias que conjugam a melhoria das condições de todos, perante outras em que “as elites” vêem com receio (ou como ameaça) a mobilidade social.
A questão das progressões revela também a qualidade do que está instituído.
As reformas empreendidas pela Nova Gestão Pública orientaram-se pela ligação entre o desempenho e o vencimento. Em Portugal elas levaram também a que, em vez de ciclos de progressão de três anos, alicerçados no tempo de serviço, passássemos para ciclos de dez anos, os quais podem ser reduzidos através do bom desempenho, com a instituição de um direito-objetivo.
Uma vez entendidos sobre esta questão podemos falar seriamente do problema das progressões dos docentes do ensino superior, sem cair em demagogias, ou reclamações particulares, ou pontuais.
Ao contrário de um orçamento preparado atempadamente em 2017, assistimos a sete meses de jogo entre o ministro Manuel Heitor e os dirigentes das instituições de ensino superior, já com o Orçamento do Estado de 2018 em vigor.
O levantamento rigoroso dos custos realizado pela Inspeção de Finanças e a conjugação coordenada e sistémica foram abandonados, demonstrando-se, mais uma vez, as fragilidades do sistema e do regime jurídico produzido em 2007.
Dessas fragilidades denota-se não só o sentido de desvalorização e injustiça em que assenta a gestão estabelecida.
Ao contrário do pensamento coordenado e de reforço positivo que prevalece no geral da Administração Pública, o ministro Manuel Heitor anunciou uma leitura da lei que restringe as progressões apenas àqueles que conseguiram obter menção máxima consecutivamente durante seis anos (no caso dos avaliados), ou com dez pontos nos casos em que foi atribuído automaticamente um ponto por ano (caso dos não avaliados).
Além da injustiça perante todas as demais carreiras e servidores públicos, dessa imposição resulta que não ser avaliado é mais vantajoso do que ser avaliado.
Não admira que tenha merecido a reprovação de todos os grupos parlamentares, exceto do Partido Socialista. Essa reação obriga a uma clarificação da lei, que impeça que o direito se constitua através de uma interpretação injusta, pouco coerente e de reduzido caráter legal.
A trapalhada adensa-se com instituições que não realizaram a avaliação atempadamente e de um congelamento que dura há praticamente 14 anos.
Há ainda um pequeno “catch”: os dirigentes são automaticamente avaliados com a menção máxima, o que significa que caso fossem aplicadas cotas, a menção máxima estaria praticamente capturada por estes.
Percebem-se as óbvias debilidades que derivam da lógica de pretenso “sucesso ou estoiro”, com suposta diferenciação das instituições em modo Terceira Via, como que esquecendo que a razão do seu sucesso foi e será o seu caráter público (sendo que todas as instituições dependem estruturalmente desse caráter público).
São erros de palmatória a mais que obrigam a uma reflexão muito séria. Isso significa falar mais de economia e sobre a razão que deve prevalecer aos desenhos institucionais.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico