David Nuno Crato Justino
O vice-presidente do PSD, o único ministro que foi ministro dos rankings, mostra-se amarrado aos erros do passado.
O vice-presidente do PSD David Justino fez publicar há dias neste jornal um artigo de crítica ao Ministério da Educação. É um artigo notável, tanto por evidenciar uma surpreendente falta de memória como por representar uma desistência.
Ao texto de David Justino falta memória. Diz que “reversão” é palavra-chave do atual Governo. Espanta que esqueça que Nuno Crato “mudou (quase) tudo o que podia mudar” (título deste jornal). Aprovou uma reforma curricular, apenas um ano depois de chegar ao governo; mudou programas, mesmo alguns em vigor escassos anos, sem estudos, sem avaliações, sem debate, sem consultar verdadeiramente ninguém; fixou novas metas curriculares, nalguns casos substituindo outras em vigor apenas dois anos; mudou a avaliação, nomeadamente introduzindo exames inexistentes na generalidade dos países desenvolvidos; afunilou as aprendizagens, modificou cargas horárias, desvalorizando disciplinas essenciais, nomeadamente as ligadas à cidadania. Assim tentou cumprir o seu programa anunciado de implodir o ministério, até pela mera incompetência na abertura dos anos letivos.
O atual Governo está, nas principais mudanças estratégicas, a seguir uma linha de decisão prudente, baseada no debate multifacetado e na implementação incremental, como está a acontecer com as questões curriculares. O PSD podia prometer não voltar a cometer os mesmos erros – mas, pelo contrário, vem ameaçar com um futuro “governo de cor diferente” que “retome a senha reversiva”. Outra vez? David Justino, se pudesse, voltava a tentar impor uma revisão da Lei de Bases só com o apoio da maioria parlamentar do momento, como fez no passado – e como a atual maioria não fez nem fará?
David Justino diz que há ideologia na governação. É verdade – tal como houve ideologia, por exemplo, quando o anterior Governo criou percursos educativos de segunda, e sem saídas, para alunos do ensino básico com episódios de insucesso, no mesmo passo contribuindo para desvalorizar os percursos profissionalizantes, num facilitismo de deixar para trás os que mais precisam da escola. Toda a ideologia do atual Governo é a contrária, para que todos tenham igualdade no acesso e ao sucesso educativo.
Mas o vice-presidente do PSD também insiste em mitos e confusões. A forma como fala de “competências” significa que não compreendeu o debate sobre O Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória – mesmo quando o Conselho Nacional de Educação, apesar do seu então presidente David Justino, recusou essa oposição entre competências e conhecimento (mais um chavão da ideologia elitista de Nuno Crato que sobrevive neste discurso). Também aqui, uma insuportável desconsideração pelas vastas convergências obtidas pelo aprofundado debate em torno do Perfil, porque o método foi construir e não dividir.
O vice-presidente do PSD critica o trabalho de melhoria das condições dos profissionais da Educação. Ora, se Roma e Pavia não se fizeram num dia, este Governo está a fazer Roma e Pavia um dia atrás do outro. Mas não seria tão difícil, e não levaria tanto tempo, se Crato não tivesse escolhido a educação para sacrificar no altar da sua ideologia de ir além da troika, cortando no sector para cima de 1000 milhões de euros além dos compromissos do Memorando de Entendimento.
O vice-presidente do PSD, o único ministro que foi ministro dos rankings, mostra-se amarrado aos erros do passado. É pena. Estou confortável nesta esquerda plural e na visão para a Educação inspirada na Constituição da República Portuguesa, por uma escola pública de qualidade orientada pela exigência de que todos aprendam mais e todos aprendam melhor, numa educação integral das nossas crianças, jovens e adultos, assente na valorização dos seus profissionais. Mas acredito que em Educação não devemos fechar-nos na maioria parlamentar, erro e tentação que David Justino cometeu. Mas, para isso, esperamos que David Justino não desista de desentranhar Nuno Crato da sua ideologia educativa e não desista de olhar para os novos desafios deste tempo.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico