E o “penta” vai para Sérgio Conceição

Chegar, ver e vencer pode ser o lema que melhor se aplica ao treinador que resgatou o FC Porto com uma receita à base de trabalho, dedicação e vontade de vencer.

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Sérgio Conceição durante esta temporada ao serviço do FC Porto LUSA/LUIS VIEIRA
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Sérgio Conceição durante esta temporada ao serviço do FC Porto Reuters/LEE SMITH
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Sérgio Conceição durante esta temporada ao serviço do FC Porto LUSA/JOSÉ COELHO
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Sérgio Conceição durante esta temporada ao serviço do FC Porto LUSA/MANUEL ARAÚJO
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Sérgio Conceição durante esta temporada ao serviço do FC Porto LUSA/JOSÉ COELHO

No dia da apresentação como treinador do FC Porto, Sérgio Conceição não perdoou uma pequena-grande imprecisão. Fiel ao estilo de quem só admite a vitória, reagiu à perda de um campeonato num milionésimo de segundo, corrigindo o número de títulos de campeão nacional conquistados ao serviço do FC Porto no mesmo instante em que era confrontado com o facto de ter vencido sempre a prova nas três épocas como jogador.

"Quatro! Foram quatro porque também ganhei o de juniores!", vincou na altura com o mesmo número de dedos levantados, numa alusão à época de 1992-93.

Foi muito por causa desta sede de vencer que o FC Porto conseguiu acabar com a seca de títulos que durava há quase cinco anos. Sem medo das palavras, Sérgio Conceição havia prometido títulos em Maio e cumpriu, ao garantir o quinto da sua conta-corrente, num balanço entre as Antas e o Dragão.

Conceição “regressou a casa” sob o signo do cinco, tornando-se o quinto antigo futebolista portista a sagrar-se campeão como atleta e treinador do clube da Invicta. Conceição sucede a Joseph Szabo, Mihály Siska, José Maria Pedroto e António Oliveira, interrompendo o ciclo do Benfica, que apostava todas as fichas no seu primeiro “penta”.

A carreira como treinador iniciou-a na Bélgica, ainda como adjunto do amigo Dominique d’Onofrio, falecido em 2016.

Mas o caminho enquanto líder começou em Olhão, com passagens subsequentes por Académica, Sp. Braga e V. Guimarães, antes de pegar no Nantes e mostrar a Pinto da Costa que estava pronto.

Até chegar ao FC Porto e decidir que estava preparado para assumir o banco, o miúdo irreverente assimilou as tácticas e os estilos de algumas referências mundiais - como Artur Jorge, António Oliveira, Humberto Coelho, Jorge Jesus, Fernando Santos e José Mourinho, passando por Eriksson, Arrigo Sacchi, Héctor Cúper, Daniel Passarella, Roberto Mancini e Scolari.

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Sérgio Conceição é o 17.º treinador a sagrar-se campeão pelo FC Porto Reuters

Fernando Couto, colega de Conceição na selecção e na Lazio, admite não se ter apercebido desta inclinação do amigo. “Curiosamente, nunca nos cruzámos no FC Porto. Convivemos muito na selecção e na Lazio. Mas para ser sincero, não previa isto pois não o via como futuro treinador”, confessa.

“Na verdade, acho que fez uma época fantástica. Gostei imenso até por ter sido um campeonato à imagem do FC Porto, com um grupo forte, com grande determinação e crença. É um título com um gosto especial, com uma atitude vencedora, à imagem do que o Sérgio foi como jogador”, acrescentou Fernando Couto, atento aos passos “seguros” dados pelo novo treinador campeão.

“Fez o percurso que tinha que ser feito. Começar como adjunto, na Bélgica, e subir cada degrau, com Olhanense, Académica, Sp. Braga, V. Guimarães e Nantes até chegar ao topo, ao FC Porto. Tudo à custa de trabalho e muita qualidade. Rodeou-se de profissionais competentes, que conheço bem, pessoas muito válidas, e impôs o estilo dele de forma vincada e forte, aproveitando bem toda a experiência e vivências acumuladas em grandes clubes, com grandes jogadores e treinadores, o que é sempre determinante. Agora fico à espera, pois pode ir muito longe. Se for com o FC Porto, muito bem. Mas os dados estão lançados”, resumiu o antigo central, feliz pela conquista de Sérgio Conceição que quando chegou ao Dragão avisou, sem hesitar, que não vinha para aprender, mas sim para ensinar. E que em Maio teria razões para dedicar novos troféus aos pais.

Um “doente da bola”

Tirando os excessos associados ao temperamento e os inúmeros episódios de rebeldia e polémicas que contribuíram para o crescimento e definição de carácter de Sérgio Conceição - que continua a não mandar recados por ninguém, seja para fora ou para dentro do próprio FC Porto - o agora treinador campeão devolveu o brio a uma equipa sem reforços, exceptuando o guardião Vaná, fruto da saúde financeira debilitada e das restrições impostas pela UEFA.

Do mau feitio de Sérgio Conceição já se pronunciou Fernando Santos, em pleno jogo de despedida de Deco, há quatro anos, num FC Porto-Barcelona em que o “engenheiro” voltou ao banco portista.

Sérgio Conceição não gostou de ser suplente e meio a brincar meio a sério garantiu estar com azia pelas escolhas de Fernando Santos. Confrontado com as “críticas” do seu ex-jogador nos gregos do PAOK, onde Sérgio encerrou a carreira de futebolista, em 2010, o actual seleccionador lembrou que ele era assim, “um doente da bola”.

Conceição era, nessa altura, treinador do Sp. Braga, que levou à final da Taça de Portugal. E Fernando Santos referiu nesse momento uma das características que melhor definem a forma de estar do agora treinador campeão nacional. “Ele nunca perderá este feitio, aliás não pode perder, até para o futuro dele como treinador. É muito importante a paixão que Sérgio tem pelo jogo”.

Domingos Paciência não equipou nesse dia, mas mais do que a maioria pode explicar o sucesso do amigo Sérgio, que baseia numa vontade indómita de vencer.

“Lembro-me como se fosse hoje. Estava no Sporting e recebi uma chamada do presidente do Olhanense a pedir uma opinião sobre o Sérgio Conceição”, recorda. Domingos acabara de passar uns dias de férias na Grécia com Sérgio e com Dominique d’Onofrio, que anunciara a saída do Standard Liège, onde treinou Conceição e o promoveu a adjunto.

“Não sei se tive muita ou pouca influência na decisão, mas conheço a personalidade do Sérgio e expliquei-lhe que tem uma vontade de ganhar impressionante”, aliada a uma ética de trabalho que ajuda a perceber os resultados neste primeiro ano de FC Porto.

“O Sérgio é uma pessoa muito ‘visual’. E quando passas pelos melhores clubes, convives com grandes jogadores e treinadores, podes usar essa capacidade. Mas julgo que o grande mérito dele no FC Porto foi o de ter percebido o contexto, ter feito a leitura correcta e canalizar tudo para um jogo diferente do adoptado por Lopetegui e pelo Nuno Espírito Santo. O futebol dele é diferente, tem que moldar e rentabilizar jogadores, alguns que todos julgavam não ter espaço no plantel. Há muito mérito nisso”, refere Domingos, sem esquecer a influência das origens humildes do amigo.

“O FC Porto transformou-se numa equipa objectiva, dinâmica, com processos mais directos na busca do golo. Essa procura constante, sem a preocupação de praticar um futebol vistoso, essa obsessão por chegar rápido à baliza tem a ver com uma visão da realidade e de alguém que subiu a pulso, que não teve nada de mão beijada, que lutou e que singrou à custa do trabalho e da qualidade. E a capacidade de trabalho do Sérgio é tremenda”, testemunha Domingos, para acrescentar um último mérito do amigo: “Para além de tudo, há a mensagem. A paixão e a crença dele contagiam os jogadores”.

Joseph Szabo, campeão nacional pelo FC Porto em 1935 DR
Mihaily Siska, campeão nacional pelo FC Porto em 1939 e 1940 DR
Dorival Yustrich, campeão nacional pelo FC Porto em 1956 DR
Béla Guttmann, campeão nacional pelo FC Porto em 1959 DR
José Maria Pedro Pedroto, campeão nacional pelo FC Porto em 1978 e 1979 DR
Artur Jorge, campeão nacional pelo FC Porto em 1985, 1986 e 1990 Fernando Veludo/FERNANDO VELUDO
Tomislav Ivic, campeão pelo FC Porto em 1988 Arquivo
Carlos Alberto Silva, campeão pelo FC Porto em 1992 e 1993 Público/Arquivo
Bobby Robson, campeão pelo FC Porto em 1995 e 1996 Público/Paulo Carriço
António Oliveira, campeão nacional pelo FC Porto em 1997 e 1998 Público/Fernando Veludo
Fernando Santos, campeão nacional pelo FC Porto em 1999 Público/Paulo Ricca
José Mourinho, campeão nacional pelo FC Porto em 2003 e 2004 Público/Hugo Delgado
Co Adriaanse, campeão nacional pelo FC Porto em 2006 Público/Paulo Ricca
Jesualdo Ferreira, campeão nacional em 2007, 2008 e 2009 Público/Paulo Pimenta
André Villas-Boas, campeão nacional pelo FC Porto em 2011 NFACTOS/FERNANDO VELUDO
Vítor Pereira, campeão nacional pelo FC Porto em 2012 e 2013 NFACTOS/FERNANDO VELUDO
Sérgio Conceição, campeão nacional pelo FC Porto em 2018 LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO
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Joseph Szabo, campeão nacional pelo FC Porto em 1935 DR
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