Estratégia para o ensino superior? Arquive-se
Agora já temos relatório da OCDE. As recomendações já conhecíamos. A grande conclusão de que não há estratégia, já suspeitávamos. Já todo o setor diz o mesmo há anos.
O ano de 2015 ficou particularmente marcado para as organizações estudantis, nomeadamente para a Federação Académica do Porto, pelas tomadas de posição e reflexões sobre o sistema de ensino, mais concretamente sobre o Ensino Superior. Estes documentos (Moção Global da FAP/Caderno Reivindicativo para o Ensino Superior) contêm um conjunto alargado de reflexões sobre o Ensino Superior português onde estão descritos diversos problemas, reivindicações e soluções, todas elas em prol de um Ensino Superior que possa ombrear com os melhores do mundo.
Enquanto estudante, dirigente, mas sobretudo como cidadão, acredito que só com um ensino (verdadeiramente) superior podemos ser um país de excelência.
Poucas foram as propostas levadas em conta. As realmente estruturantes ficaram pelo caminho. Outras foi o faz de conta... Nem reforço de investimento, nem revisão da fórmula de financiamento das IES. O contrato-programa de legislatura já ficou por cumprir... Micro-reforço de ação social só a reboque das atualizações do IAS. Revisão do RJIES... nadinha. Podíamos falar da diminuição da dispersão organizacional, sem desperdiçar a capacidade instalada; da possibilidade de alguns institutos politécnicos poderem ministrar doutoramentos, entre muitas outras onde as grandes decisões continuaram/continuam a ser empurradas com a barriga para a frente.
No passado dia 9 de fevereiro, no Teatro Thalia, foi apresentado o relatório sobre o sistema de Ciência, Tecnologia, Inovação e Ensino Superior encomendado à OCDE e que foi realizado durante os anos 2016-2017. Este relatório pretende ter uma visão geral do estado da inovação, tecnologia e da educação superior, contemplando inúmeras recomendações a este sistema no nosso país. E para surpresa (ou não!), uma grande maioria das reivindicações acima referidas constam no leque das 30 medidas apresentadas nas conclusões deste relatório.
Ora, este conjunto de alertas já foi dado a conhecer, não só pelas organizações estudantis, mas também pelas instituições de Ensino Superior (CRUP e CCISP). De tudo isto, é de realçar o valor concreto de investimento no sistema, 1200 milhões de euros até 2030, o estímulo da criação de cerca de 2000 empregos/ano nas empresas para inovação e desenvolvimento (para doutorados), indicadores apontados pela OCDE.
Em reação ao relatório, o sr. ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior relativiza, à partida, a análise feita pela entidade de que o país precisa de ter uma estratégia para as políticas de ciência, inovação e Ensino Superior, devendo reforçar a sua coordenação.
Contudo, houve já uma grande mexida. Na passada semana, foi levada a Conselho de Ministros, aparentemente sem se efetuar qualquer reflexão alargada, um projeto de decreto-lei que ainda requer entendimento entre os partidos políticos com assento na Assembleia da República, onde todas as instituições de Ensino Superior (incluindo os politécnicos) passam a poder ministrar doutoramentos, desde que as suas unidades de investigação adquiram classificação igual ou superior a “Muito Bom” atribuída pela Fundação para a Ciência e Tecnologia.
Esta alteração, que considero positiva, vem ditar uma mudança paradigmática no sistema de Ensino Superior. No entanto, é uma alteração que considero reacionária, isolada e tomada de forma avulsa, tal como todas as que foram tomadas durante a atual legislatura; esta foi apenas para dizer que se fez alguma coisa com o documento produzido pela OCDE, sem nunca refletir sobre a estratégia global para o sistema de Ensino Superior.
Agora já temos relatório da OCDE. As recomendações já conhecíamos. A grande conclusão de que não há estratégia, já suspeitávamos. Já todo o setor diz o mesmo há anos.
O sr. ministro relativiza. Onde é que está a estratégia para o Ensino Superior? Arquive-se.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico