Cartão Vermelho para o PSD?
Como os dois partidos — PSD e CDS-PP — se distinguem pouco do ponto de vista ideológico, torna-se fundamental escolher candidatos em que os cidadãos depositem confiança.
Estas eleições foram sui generis: as autárquicas são normalmente uma ocasião para enviar um cartão amarelo ao governo. Por exemplo, em 2013, o PSD perdeu muitas câmaras e votos. De vez em quando, o eleitorado até chega a enviar não um cartão amarelo, mas vermelho ao executivo. Em 2001, o governo demitiu-se no seguimento das eleições locais. Na noite eleitoral, depois de ter perdido 14 câmaras entre elas Lisboa e Porto, Guterres demitiu-se para “evitar um pântano político”. Antes de 2001, houve ainda outro governo que caiu, em 1982: o da AD de Pinto Balsemão, que dessa vez se guiou pela percentagem de votos: tinha colocado uma fasquia de 45% e nesse ano a AD não foi além dos 42%.
Mas em 2017, o governo não estava propriamente em causa. E por várias razões: por um lado, porque o PS está com grande popularidade e isso reflectiu-se no voto também a nível autárquico. Depois porque o quadro macroeconómico tem evoluído muito positivamente, tanto ao nível dos indicadores financeiros como do crescimento e do desemprego, favorecendo os partidos que apoiam o governo. Já se sabia que o PS não iria ser punido nestas eleições. Segundo as projecções os resultados nos grandes centros urbanos (até no Porto, se tivermos em conta que foi uma candidatura tardia), podem ser vistos positivamente para o PS — e para a esquerda em geral. Mesmo Medina parece ter alcançado a maioria absoluta em Lisboa.
Quem esteve em causa foi o principal partido da oposição, o PSD, e o seu líder, Passos Coelho. Sendo a primeira eleição depois de 2015, e tendo em conta que Costa não ganhou essas eleições, esta era uma eleição de tira-teimas entre os dois líderes. Depois porque tendo perdido muitas câmaras em 2013, era importante recuperar nos grandes centros urbanos, para evitar críticas de uma certa “ruralização” do partido.
No momento em que escrevo, ainda não se sabem os resultados definitivos, tendo apenas conhecimento das projeções. No entanto, já se sabe que em Lisboa, o PSD fica entre 8% e 9% dos votos e talvez em quarto lugar, atrás da CDU. No Porto, o PSD arrisca ficar apenas com um vereador. Em Coimbra não venceu ao PS. É difícil dizer se estamos perante um cartão amarelo ou vermelho. Mas dificilmente o partido poderá evitar a necessidade de repensar a sua estratégia política actual.
Obviamente que as eleições não são apenas determinadas por fenómenos nacionais, nem os seus resultados podem ser assacados ao líder. Tanto José Eduardo Martins como Teresa Leal Coelho deram o corpo às balas, assumindo-se como únicos responsáveis pelas derrotas e por isso escudando Passos Coelho. Mas mesmo algumas das dinâmicas locais falhadas são devidas à inércia do líder do PSD. Em Lisboa, tudo leva a crer que o trabalho de campanha porta a porta ao longo de meses, foi importante para conseguir que houvesse transferências de voto do PSD para o CDS-PP. Assunção Cristas teve em empenho e motivação aquilo que faltou a Teresa Leal Coelho. Esta última candidatou-se tardiamente e pouco se viu até propriamente ao início da campanha. O país não é só Lisboa, e é possível que a liderança do PSD não entenda estas autárquicas como um cartão vermelho. Haverá claro, várias condicionantes, incluindo a existência de um candidato alternativo forte que se oponha a Passos Coelho.
Mesmo assim, a confirmarem-se estas projeções confirmamos o que já se sabia. Os líderes são extremamente importantes à direita. Como os dois partidos – PSD e CDS-PP – se distinguem pouco do ponto de vista ideológico, torna-se fundamental escolher candidatos em que os cidadãos depositem confiança. Se isso é verdade a nível autárquico, ainda o é mais quando o que está em causa é o lugar de primeiro-ministro.