O dia em que o Posto de Turismo voltou a ser fronteira
Pela terceira vez desde 1985, o controlo de fronteiras voltou a ser activado. A Operação Fronteira Branca fica a dever-se à visita do Papa e envolve milhares de pessoas. Normalidade foi a palavra de ordem no primeiro dia.
Ainda há quem vá a Badajoz comprar caramelos, nem que seja por algum saudosismo do tempo em que havia coisas em Espanha que não chegavam a Portugal. Hoje, são mais os que vão pelos combustíveis, mais baratos no país vizinho. O fim da fronteira, após Portugal ter aderido, em 1995, ao acordo de Schengen, facilita o vai vem. Ontem, a fronteira do Caia voltou a ser activada. Com toda a tranquilidade. A maior parte das reacções foi de surpresa, por o agora posto de Turismo voltar a ser um posto fronteiriço.
Nove horas da manhã de quarta-feira. Passando Elvas só se percebe que se está em Espanha quando nos deparamos com uma enorme parede “decorada” com as palavras El Corte Inglés. Já o regresso é diferente. Meia dúzia de carros, cerca de três dezenas de homens e mulheres fardados anunciam o que já se sabia há bastante tempo: devido à visita do Papa e por razões de segurança o controlo documental foi levantado nas fronteiras marítimas, aéreas e em 9 terrestres, as únicas com passagem autorizada desde as zero horas de ontem até às zero horas de domingo. A velhinha fronteira do Caia é uma delas.
A azáfama é muita, mas é mais o aparato que o trabalho para os vários agentes. Há homens do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que coordena a operação, da GNR, da Autoridade Tributária e Aduaneira, das espanholas Guardia Civil e Corpo Nacional de Polícia.
“Então isto é para quê?” pergunta um homem depois do militar o cumprimentar com uma continência e lhe pedir os documentos de identificação. “É um controlo documental de fronteira, determinado devido à visita do Papa”, explica o guarda.
António Joaquim tinha partido de Sousel manhã cedo para “ir atestar” o carro a Espanha. Foi surpreendido pela operação que não acha “bem, nem mal”. “Se as pessoas tiverem ideia de fazer mal [ao Papa] fazem sempre mal, não passam de um lado, passam de outro”, afirmou aos jornalistas.
O principal trabalho de agentes e militares é verificar os documentos de identificação e de todas as viaturas que por ali passam.
Quando algum viajante levanta suspeitas, especialmente se for um cidadão de um país que não pertence à União Europeia, o carro é estacionado, os ocupantes revistados e entram em acção as equipas do Grupo de Intervenção Cinotécnico da GNR, com dois cães, um treinado para detectar droga e armas e outro “especialista” em explosivos e os respectivos treinadores.
Aos membros da Autoridade Tributária e Aduaneira cabe, com análises no local, verificar se alguma viatura é ilegalmente movida a gasóleo agrícola, mais barato que o vulgar e que só pode ser usado no trabalho rural.
“Está tudo a correr lindamente e com a maior tranquilidade”, garantiu ao PÚBLICO o oficial de relações públicas do Comando Territorial de Portalegre da GNR, tenente-coronel Carlos Belchior.
De facto estava, o trabalho foi sendo feito calmamente, não causando demoras aos automobilistas nem grande stress aos agentes, que até tinham tempo para fazerem fotos com os seus colegas espanhóis para mais tarde recordarem aquele dia raro, que, desde o acordo de Schengen, só tinha acontecido no Europeu de futebol (2004) e na Cimeira da Nato (2010).
O trabalho dos militares da GNR na região não se fica apenas pelo Caia. Têm ainda de vigiar outras passagens fronteiriças que não foram alvo de controlo, mais as chamadas “fronteiras invisíveis”, pontos de passagem sem posto, muitas delas em caminhos rurais. Um trabalho que só na região envolve mais de 500 agentes.
O espanhol Jaime Robredo vem de Badajoz e vai para o Algarve passar “uns dias de férias” com a mulher. Espanta-se com o aparato policial. Depois de esclarecido do porquê da operação, solta um sonoro “bueno”. “Se é para proteger o Papa vale a pena. Gosto muito do Papa Francisco.” Não vai, porém, a Fátima vê-lo. “Tenho hotel marcado no Algarve.”
Os homens do SEF também dizem que a operação “está a correr em perfeita normalidade”. Esta força policial tem quase a totalidade dos seus membros envolvidos nesta operação que, a nível nacional envolve ainda mais oito pontos de passagem terrestre, 21 marítimos e nove aéreos.
“É um bocadinho como voltar ao passado, mas esta malta está toda muito bem treinada”, assegura José Caçador, subdirector regional do SEF, que por estes dias foi deslocado de Lisboa para Elvas.
Entre as zero horas e o meio-dia de ontem foram impedidos de passar a fronteira do Caia sete pessoas. Uma foi detida por conduzir sem carta e seis obrigadas a regressar a Espanha por não possuírem documentos que os autorizassem a circular em Portugal.