Se o SNS fosse um Banco...
Nunca há dinheiro para a Saúde. Mas este aparece, como por milagre, sempre que um banco necessita de apoio financeiro.
Se o Serviço Nacional de Saúde (SNS) fosse um banco, já há muito que teria sido resgatado.
Se o SNS fosse considerado como uma mais-valia para os portugueses e essencial para o país, já teria tido uma injeção de capital de vários milhares de milhões de euros. Com a bênção da União Europeia, do Fundo Monetário Internacional e de qualquer outro ministro das Finanças europeu.
O problema é que o valor social do SNS é considerado residual perante o valor económico que qualquer banco português possa representar. Este é o exasperado pensamento político atual.
É o entendimento exíguo de quem nos anda a governar há décadas. E é o discurso dominante pretensamente correto que nos andam a impingir. De tal forma que, tornou-se banal ouvir dizer que o país tem de se sacrificar, durante várias décadas, em nome da sobrevivência dos bancos, e, simultaneamente, tem de aguentar estoicamente perante a degradação do SNS.
Hoje, é tão normal ver um governante anunciar a injeção pública de milhões de euros num Banco, assim como outro ministro a dizer que o SNS não precisa de dinheiro, mas, antes, de organização e eficiência.
Banalizou-se a ideia de deixar o SNS moribundo. Que se aguente!…
Nunca há dinheiro para a Saúde. Mas este aparece, como por milagre, sempre que um banco necessita de apoio financeiro. E não estamos a falar de migalhas.
Nestes últimos anos, fomos surpreendidos com os resgates milionários do BPN, do BCP, do BES, do BANIF e, agora, da CGD. A nossa geração (e as próximas) demorará a pagar a dívida criada pela incompetência, irresponsabilidade e negligência de banqueiros e políticos.
Em dez anos, os bancos portugueses receberam mais ajuda financeira do que todo o programa da Troika emprestou a Portugal! Quase 90.000 milhões de euros. Nesse mesmo período, o Estado português gastou 10% do seu Produto Interno Bruto no apoio à Banca.
Isto diz muito da importância que é atribuída aos setores de apoio social, nomeadamente à área da Saúde. Diz muito dos valores que hoje importam verdadeiramente para quem tem o poder de decidir o destino de Portugal.
Existe a ideia que não se pode deixar falir um banco ou sequer permitir que esteja subfinanciado.
Hipocritamente, também existe a ideia de que o país já não tem dinheiro para gastar com a educação, com os transportes ou com a saúde.
Há dias, o Diretor Geral da Saúde afirmou, com uma insensibilidade arrepiante, que podíamos “fazer mais com menos” dinheiro, demonstrando uma total despreocupação por um setor onde desempenha importantes responsabilidades, há já largos anos. Curiosamente, nunca ouvi nenhum responsável de um governo dizer que a Banca se deveria desenrascar com menos para poder enriquecer mais.
Lentamente, este paradoxo está a fazer caminho. Tolera-se o inaceitável.
Recentemente, a Ordem dos Médicos veio pedir que, do Orçamento de Estado disponível para 2017, fosse alocada uma parcela maior para a Saúde. Não implica mais gastos, implica somente que se priorize este setor.
De facto, o SNS não é um banco, mas os seus ativos são bem mais preciosos: as pessoas e, sobretudo, as que necessitam desesperadamente de cuidados de saúde. Investir neste setor teria um retorno inestimável, esse sim, reconhecido por muitas futuras gerações.
Presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos