Costa anuncia 13 medidas no primeiro debate como primeiro-ministro

Líder do PS elencou medidas a aplicar nos próximos anos, piscou o olho à esquerda e deixou sem resposta pergunta da direita sobre aumento de impostos.

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António Costa no debate do programa de Governo Miguel Manso

O segundo debate sobre um programa de governo desta legislatura trouxe esta quarta-feira ao Parlamento um primeiro-ministro municiado para o embate com uma mão cheia de medidas políticas. O socialista António Costa aproveitou a discussão que termina esta quinta-feira para apresentar algumas das iniciativas que tenciona implementar ao longo dos próximos anos. Desde as mais imediatas até outras agendadas para daqui a três anos, foram 13 os compromissos que o líder socialista assumiu no plenário.

O grau de precisão, no entanto, variou muito. As relativas à concertação social chegaram aos deputados com datas e objectivos quantificados. Assim como as relativas aos fundos europeus. Depois da defesa da opção pela “melhoria do rendimento das famílias”, Costa focou a sua atenção nas “condições de investimento das empresas”. Foi aí que, depois de uma crítica velada ao anterior executivo, o novo primeiro-ministro anunciou para o “imediato” – até ao “final dos cem primeiros dias de Governo” – o acelerar da tramitação do programa de financiamento Portugal 2020, para que possam ser “ultrapassados os 100 milhões de euros de pagamentos efectivos às empresas”. Na mesma linha prometeu reforçar em “35 milhões de euros os fundos de apoio ao Sistema de Garantia Mútua” para as empresas.

Mas essas foram mesmo as iniciativas mais especificadas na intervenção inicial de António Costa. As restantes ficaram-se pela assumpção do compromisso. O socialista não precisou quanto, nem quando, tencionava inscrever, por exemplo, no fundo de capitalização para as empresas. Também não disse quando tencionava ter de pé – ou com que verbas contaria – o “Programa Semente dirigido ao empreendedorismo e à criação de start-ups”. Sobre o Simplex, depois de anunciar o seu “regresso em força”, acrescentou apenas que o pretendia ver alargado a “sectores cruciais como a Justiça”. Da mesma forma, explicitou apenas que a “criação do contrato de geração” servia para permitir o “acesso à reforma a tempo parcial, com contrapartida da contratação de jovens a tempo inteiro”. E também não disse quando é que tencionava ver aprovada no Parlamento a “redução do IVA para 13% na restauração” ou em que ano o “amplo programa de reabilitação urbana” estaria no terreno. Também só enunciou a intenção da “criação de um crédito fiscal negativo” para os trabalhadores que viviam abaixo do limiar da pobreza e pouco explicou sobre a “estratégia integrada de combate à pobreza infantil”.

Ao longo do debate teve oportunidade para somar outras promessas, mesmo reiterando o compromisso de manter o défice público abaixo dos 3%, como a da reversão das concessões a privados dos transportes públicos de Lisboa e Porto. "Felizmente, a cegueira e o radicalismo foi tanto, a trapalhada foi tanta, que o Tribunal de Contas não visou os contratos e hoje é possível desfazer essa negociata sem que isso custe dinheiro ao Estado nem implique indemnizações", disse numa resposta ao centrista Nuno Magalhães. Mas foi, precisamente, a esse deputado que não respondeu, depois de ter sido desafiado a dizer se tencionava aumentar impostos.

Avisos do PCP e Bloco
Já em relação à esquerda houve outro esforço para não deixar dúvidas por esclarecer. Mas as intervenções vindas daí foram mais ao estilo "uma no cravo outra na ferradura". O secretário-geral comunista, Jerónimo de Sousa deixou críticas à direita, que acusou, por exemplo, de “alimentar uma estéril guerrilha política”, para depois aproveitar para lembrar ao novo primeiro-ministro que era bom que concretizasse a esperança que dera aos eleitores de esquerda. Tal como a porta-voz do Bloco, o secretário-geral do PCP alertou para as “surpresas desagradáveis que o anterior Governo PSD/CDS deixa ao país” e que ainda não foram reveladas.

“É verdade que este não é um programa do PCP”, disse Jerónimo, elogiando o facto de o documento “registar a vontade de mudança”. Lembrou ser preciso “ultrapassar a divergência” entre as “regras draconianas e constrangimentos e a necessidade do desenvolvimento soberano”, numa alusão aos compromissos europeus. Mas, para já, a prioridade é outra: “Valorizamos a resposta a problemas mais urgentes dos portugueses, ao mesmo tempo que colocamos a necessidade evidente de uma política patriótica e de esquerda.” O líder comunista não terminou sem um aviso subliminar a Costa: “Está aberta uma janela de esperança, aquela que não fica à espera. Estará de acordo, senhor primeiro-ministro, que é necessário concretizá-la.”

Costa assumiu que há uma posição diferente de socialistas e comunistas sobre a Europa, mas relativizou: “O que o PCP não está disponível para apoiar é o que nós também não estamos disponíveis para propor.” O governante vincou ainda: “Nós sabemos que podemos confiar naqueles com quem criámos esta solução de Governo. E podemos confiar no PCP para governar nessa perspectiva da legislatura.”

Directa ao assunto, Catarina Martins quis respostas de Costa sobre quando haverá condições para uma fiscalização eficaz das condições laborais e como serão tratados os novos contratos de trabalho. Na resposta à lider do BE, o primeiro-ministro não deu um prazo, mas reiterou o compromisso do acordo à esquerda: combater a precariedade através da “alteração da legislação e da fiscalização”.

“Vistas as diferenças [entre os programas de PSD/CDS e do PS], é normal que a direita apresente uma moção de rejeição. O programa é diverso e ofende-a”, resumiu a porta-voz bloquista. “Apresentem pois, a moção de rejeição, nós cá estaremos para a chumbar.”

“Que medidas tem o Governo para combatermos a pobreza no curto prazo?”, inquiriu Heloísa Apolónia, dos "Verdes", lembrando que não basta aumentar o salário mínimo e repor salários e pensões e pedindo que o executivo faça “uma política de verdade”. “Como vamos inverter o ciclo de empobrecimento?”, quis saber a ecologista, que pretende a mesma resposta sobre o combate às “assimetrias” do país. Costa não foi muito claro embora, já tivesse prometido um programa de combate à pobreza, e disse que o paradigma tinha que mudar do corte dos rendimentos para uma economia que funcione.

O PAN quis compromissos nas touradas, nos produtos biológicos e nas barragens, mas Costa só anuiu às primeiras.

À direita, sentados na primeira fila das bancadas da oposição, Passos Coelho e Paulo Portas escolheram ficar em silêncio no primeiro dia de debate – opção que foi criticada por António Costa – e cederam a palavra aos seus líderes parlamentares. Luís Montenegro, pelo PSD, começou por questionar a legitimidade política do Governo. “O povo não o escolheu para ser primeiro-ministro, o povo não escolheu o programa do PS e muito menos o programa do BE e PCP para ser a base da política”, atirou, acusando Costa de ter “congeminado” esta solução “antes das eleições”. Desafiou o chefe de Governo a apresentar uma moção de confiança, mas a resposta já era a esperada. “Só precisa de confiança quem não tem confiança. E este -  lamento desiludi-lo  - é um Governo que se apresenta com confiança, com um suporte maioritário no Parlamento”, disse, suscitando palmas do PS mas não das restantes bancadas à esquerda.

O primeiro-ministro teve que justificar a solução de Governo encontrada e atravessou-se pelo PCP e BE ao dizer que a nova maioria não se limitou a ser “do contra” e foi capaz de encontrar uma “alternativa”. Uma “novidade” e o fim de um “tabu de há muitos anos”, notou. PSD e CDS “falharam” num entendimento com o PS: “Porventura confiaram nesse tabu e confiaram na sorte”.

António Costa viria a ser novamente confrontado com a sua legitimidade política pelo líder da bancada do CDS. Nuno Magalhães acusou-o de ser um primeiro-ministro que “não ganhou eleições” e justificou a moção de rejeição: “Politicamente não estamos de acordo com o que aconteceu, e economicamente temos medo do que possa vir a acontecer”.

Na resposta, o primeiro-ministro começou por ripostar para o partido de Paulo Portas, dizendo não se lembrar “desde quando o CDS não vai a votos”. Depois usou o humor: “Eu é que negociei com o PCP mas vocês é que ficaram com a cassete”. Não provocou risos na bancada comunista. A resposta ao CDS veio em forma de pergunta. "Querem demitir este Governo, mas qual é a alternativa que propõem ao país relativamente a este Governo?", questionou, gerando protestos na bancada do PSD. Muitos deputados gritaram “eleições, eleições”.

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