A social-democracia: um caminho para Portugal
O PSD tem de voltar à social-democracia e deixar o programa liberal para o CDS e voltar a políticas que ofereçam mais futuro do que contas equilibradas.
Portugal acaba o ano de 2015 com uma sociedade dividida entre dois grupos políticos, designados de forma simplista como direita e esquerda. Os rótulos reduzem tudo a um dualismo “nós e eles” que exclui os que se recusam a integrar as legiões eleitorais que seguem o chefe de serviço em cada lado.
Criar condições para governar fazendo reformas profundas no Estado, a partir de propostas inovadoras, impõe reestruturar o funcionamento dos partidos políticos e o acesso a cargos de direção pública; adequar o modelo de ensino à sociedade que queremos ter; redefinir as políticas públicas de emprego e de comunicação; reformular os meios de obtenção de receita pública e de transparência nos gastos dos titulares de cargos públicos.
Não é possível fazê-lo – e é imprescindível que o façamos – com o atual discurso político-partidário hermético e de passa-culpas; com o jornalismo que temos, superficial e casuístico; com os níveis de analfabetismo cultural das elites; com os exemplos apontados como modelos a seguir; com serviços públicos degradados e insuficientes.
Como sair daqui? Como pegar no que existe e, sem novos começos, iniciar as reformas referidas? Como mobilizar energias para os desafios colocados a uma sociedade que se empenhe em tal processo? Como afastar os instalados do sistema, os beneficiados da situação que está? Como convencer os eleitores a serem agentes da mudança?
Recuperando o Estado Social, com as adaptações impostas pela realidade atual, que permitiu à Europa desenvolvimento e paz. Um Estado que supere o momento financeiro que o endividou; que não reduza a política ao orçamento; que faça da pessoa o centro do bem comum a promover pelo Governo.
Em Portugal a agenda política é das empresas de comunicação social; o discurso dos políticos é só para os consumidores de TV; a opinião pública resultante da sondagem determina as propostas dos partidos; e as estatísticas são o argumento que as sustenta. Passamos da sociedade líquida à política gasosa sem sociedade.
A social-democracia assenta numa recolha de impostos progressivos consoante os rendimentos como base da receita do Estado para gastar em políticas públicas que promovam a igualdade de oportunidades entre todos; e na liberdade pessoal com responsabilidade pelo outro, instituída como solidariedade. A ideologia que cria e mantém o Estado Social não depende, para ser exercida no Governo, de cofres cheios e políticas de endividamento.
Nos partidos sociais-democratas, militantes sem ideologia e com o único propósito de seguir carreira e subir na vida conduziram a lideranças de oportunidade; a comportamentos de seita; a projetos políticos frágeis e erráticos; ao pragmatismo sem ideias; e a aliados de ocasião. Esta situação desacredita os partidos da social-democracia.
Preocupados com a dívida externa, estes partidos esquecem a dívida social, o descrédito institucional e o abandono moral que resultou das suas ações governativas. Anos e anos de governo desperdiçados pelo afastamento dos ideais sociais-democratas. O resultado é um retrocesso cívico crescente e uma sociedade empobrecida e arrasada que só a social-democracia poderá, a custo, regenerar.
Aos líderes tudo é permitido fazer, desde que ganhem eleições e distribuam o que podem “pelos seus”. Incapazes de pensar além do interesse pessoal e das táticas para conquistar o poder, os partidos sociais-democratas esqueceram o bem comum e a forma de o construir. O que discutem entre eles deixou de interessar a quem vota; o que acham importante não é para quem sofre quotidianos de sobrevivência; o que decidem não é aceite por quem executa.
O PSD tem de voltar à social-democracia e deixar o programa liberal para o CDS; tem de recusar ser de direita, porque a social-democracia não o é; e voltar a políticas que ofereçam mais futuro do que contas equilibradas.
Os sociais-democratas precisam de voltar urgentemente ao PSD, à militância por ideais sociais no partido; à renúncia aos interesses do capital opostos à primazia do social; às políticas públicas fundadas na ideologia social-democrata, recusando pragmatismos oportunos sem projeto e sem futuro; e a um discurso fora da teia do jornalisticamente aceite. A social-democracia, sendo caminho, pode ser solução.
Eduardo Vera-Cruz Pinto
Director da Licenciatura em Direito da Universidade Europeia