Porque não se alterou o sistema partidário português, como na Grécia ou Espanha?
Em Portugal, os anos de crise não conduziram ao aparecimento de forças como Podemos, Cuidadanos, Syriza, ou Frente Nacional.
O anunciado colapso do actual sistema partidário, entre a punição e o forte sentimento antipartidos, era o desafio destes quatro anos de estabilidade austera. A pergunta mais repetida dos últimos anos pelos observadores estrangeiros da democracia portuguesa é porque é que em Portugal não surgiram Podemos, Cuidadanos, Syriza, ou Frente Nacional?
A pergunta é pertinente. De facto quando olhamos para o peso eleitoral dos principais partidos de governo em Portugal (PSD-PP-PS), Espanha (PP-PSOE), para não falar na Grécia, Portugal acompanha algum declínio mas ainda de longe. Há um factor sobre o qual não vale a pena insistir: a sociedade deseja-os mas o sistema eleitoral e os grandes partidos não deixam. Sem um sistema de duas voltas, ou com limites de 5% para ter representação no Parlamento, em Portugal os novos, mesmo com poucos eleitores, irrompem com facilidade em S. Bento. E na verdade, sobretudo à esquerda, eles irromperam. Apesar do PCP ser uma escora poderosa, o Bloco de Esquerda anda de saúde já há longos anos e oferta nas suas laterais não falta. Mais interessante é o “congelamento” da representação política da direita nos últimos 40 anos.
A sequência política é também importante. Ironicamente, o facto de ter sido uma coligação PSD/CDS-PP a realizar o fundamental do programa de austeridade pode ter sido um factor de sobrevivência do actual sistema partidário perante a crise. Imaginemos o Partido Socialista (como aconteceu a outros) protagonista no poder do programa da troika durante estes últimos quatro anos? Onde é que ele estaria a no final desta semana? Há também factores de oportunidade política: espaço para Marinho e Pinto, por exemplo, existe, mas também pode ser desbaratado.
Finalmente, há um factor em que tenho insistido, ainda que não o consiga fundamentar. É verdade que, como lembrava recentemente um colega nosso, Alexandre Afonso, Portugal tem uma taxa de eleitores alienados da política bem maior do que muitas outras democracias europeias, mas com iguais níveis de desconfiança nos políticos. Se eleitores descontentes, mas politizados, votam em partidos de protesto, os descontentes apáticos saem de jogo. Quando os grandes se aguentam, o desafio é ir escarafunchar esses 40% dos nossos compatriotas, o que é não é tarefa fácil. Professor no Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa