Exames: é preciso conhecer a escola
Os exames promovem um ensino facilitista, em que o aluno é convidado a empinar matéria de forma intensiva para a “vomitar” no dia do exame.
Segundo essas vozes, que mais uma vez desenterram o fantasma das ciências da educação, é falsa a afirmação de que os exames não melhoram aprendizagens ou a ideia de que o exame de 4.º ano é precoce.
É preciso conhecer a realidade da escola e da aprendizagem antes de se desatar a opinar sobre estas matérias, que têm demasiada importância na vida dos estudantes.
É inegável que a avaliação externa tem um efeito sobre as práticas. Conteúdo que sai num exame ou prova de aferição passa a ser ensinado no ano seguinte. Isso é mais que sabido e, nesse sentido, as provas externas são e sempre foram reguladoras das aprendizagens.
Contudo, é importante distinguir avaliação de aferição. Uma prova externa tanto pode servir para avaliar o aluno como para aferir as práticas e o que é ensinado no sistema. A ideia de que os alunos se empenham menos se as provas forem de aferição e não de exame é absolutamente falsa e só quem nunca esteve à porta de uma escola de primeiro ciclo em dia de prova de aferição é que o pode afirmar.
A melhoria da aprendizagem dos alunos faz-se através da melhoria das práticas de ensino, com metodologias adequadas, com desenvolvimento de treino, competências de estudo e dinamização de situações de aplicação dos conteúdos adquiridos. Os exames promovem um ensino facilitista, em que o aluno é convidado a empinar matéria de forma intensiva para a “vomitar” no dia do exame.
É falacioso pensar que uma cultura de exames promove melhores aprendizagens, porque os exames potenciam apenas um tipo muito preciso de resolução de problemas. Prova disto é o facto de, como se sabe, em grande parte das salas de aula, o terceiro período ser passado a “preparar os alunos para os exames”. O que é isto? É passar o tempo a treinar os alunos a saber responder às perguntas standardizadas dos exames e a orientá-los para os melhores desempenhos naquele tipo específico de situação.
O pensamento crítico, a capacidade de análise, a reflexão, que são bem mais exigentes, ficam perdidos e desperdiçam-se dois a três meses de trabalho no treino para um exercício de duas horas.
Além disso, sabemos também que a obsessão com os exames levou a que, no primeiro ciclo, o ensino de matérias que não são alvo de exame tenha sido absolutamente secundarizada. Os alunos preparam-se para o exame de português e matemática (o que não significa que estudem, de facto, estas disciplinas) e deixam de estudar ciências ou história, porque o que importa para a escola e para eles é a nota do exame.
É preciso conhecer a realidade escolar para se comentar o que se passa. Quando António Costa diz que os exames não melhoram as aprendizagens, tem toda a razão. Os maiores progressos na aprendizagem dos alunos foram trazidos por programas que implicaram formação dos professores e a sua atualização científica, reflexão sobre práticas e trabalho conjunto para aferição das metodologias de ensino com mais eficácia. Refiro-me, por exemplo, ao trabalho desenvolvido pela Rede de Bibliotecas Escolares ou pelo Plano Nacional para o Ensino do Português. Estes programas melhoraram aprendizagens. Os exames, por si só, não o fazem. Os maus resultados nos exames, que se repetem ano após ano, são a evidência mais clara disto mesmo.
Que haja, pois, coragem política para se fazer o que tem de ser feito, contrariando a ideia de que é preciso um exame de 4.º ano apenas em nome do saudosismo.
FCSH/Universidade Nova de Lisboa