Igualdade? Continuamos à espera
As mulheres são metade da população mundial e ainda correspondem a 70% das pessoas em situação de pobreza no mundo.
A eleição de Portugal para a Vice-Presidência da 69ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, a consulta parlamentar sobre as Agendas inacabadas de 28 de Março último, a atenção que Direitos Humanos, Saúde e Desenvolvimento exigem no quotidiano, para não recuar (mais) nos ganhos alcançados, o facto de integrar a Comissão Parlamentar de Saúde e o Grupo Parlamentar Português sobre População e Desenvolvimento, motivaram a presente reflexão.
Os números são aqueles que ouvimos frequentemente:
As mulheres são metade da população mundial e ainda correspondem a 70% das pessoas em situação de pobreza no mundo.
As mulheres executam dois terços das horas laborais , em todo o mundo, apenas auferindo um décimo dos rendimentos.
A cada minuto que passa, 26 meninas são forçadas a casar precocemente.
Cerca de 40% dos assassinatos de mulheres são cometidos por um marido ou parceiro.
21,4% dos lugares nos Parlamentos e 8% dos lugares executivos são ocupados por mulheres.
Mais de 289.000 mulheres morrem por ano por complicações associadas à gravidez e ao parto, o que corresponde a cerca de 800 mulheres por dia e paradoxalmente 90% destas mortes podem ser evitadas.
O Direito à Saúde, à Educação, à Igualdade e não discriminação, mesmo em situação de pobreza ou doença e independentemente do sexo ou idade estão consignados na Constituição, mas também nos vários documentos de Direitos Humanos que Portugal vem assinando ao longo dos anos. Por outro lado, a nossa pertença a várias organizações como a ONU, a União Europeia, a CPLP e a CEPAL obrigam-nos a atuar de uma forma mais consistente e global.
Portugal ganhou a luta face à mortalidade materno-infantil e à iliteracia graças ao investimento no Serviço Nacional de Saúde, universal e tendencialmente gratuito, à educação obrigatória, aos mecanismos de proteção e segurança social à infância, juventude, aos enquadramentos legislativos de proteção da maternidade e paternidade, legislação e planos em matéria de Igualdade, violência doméstica, tráfico de seres humanos, mutilação genital feminina, discriminação de género e à clara defesa dos direitos e saúde sexual e reprodutiva de todas as pessoas... ganhou graças ao investimento coletivo no desenvolvimento e em direitos humanos.
No entanto, ainda hoje, quando olhamos os números, vemos um mundo maior (7 mil milhões de pessoas) e mais desigual. Enquanto deputada tenho tido oportunidade com o UNFPA e o Fórum Europeu de Parlamentares de conhecer programas noutros países onde o grande desafio que enfrentamos globalmente é o acesso adequado de jovens e das mulheres aos serviços e cuidados de saúde, incluindo sexual e reprodutiva no contexto dos cuidados primários e de proximidade geográfica. Os programas de planeamento familiar, saúde materna, infantil e neonatal, saúde de adolescentes fazem a diferença e estão entre os fatores que têm contribuído para a redução da transmissão vertical do VIH/SIDA, ainda hoje em Portugal.
Portugal teve estes resultados porque conseguiu graças ao SNS colocar as pessoas no centro da sua atuação, foi capaz de ultrapassar os três atrasos que influenciam a saúde, nomeadamente a materna e neonatal: o atraso na procura de ajuda, o atraso no encontrar um serviço de saúde e o atraso no receber cuidados adequados quando chega aos serviços. Até quando? Os sinais de preocupação são evidentes.
Estes resultados, reconhecidos internacionalmente como boas práticas, precisam de reforço claro nos programas de cooperação e intervenção oficiais, mas também da sociedade civil e do setor privado. É de responsabilidade e solidariedade e também política de investimento no futuro, que se trata.
A visão não pode continuar a ser espartilhada não é isso que faz a especialização nem assegura a prevenção e a fertilidade sustentável.
Estamos ainda longe da implementação da futura agenda (que será apresentada em Setembro de 2015), mas as negociações estão a decorrer. Esta será uma agenda global que visa responder não apenas às assimetrias, mas às desigualdades, e em Portugal como nos países e programas de saúde fortemente afetados pela crise económica internacional, as pessoas não podem ser esquecidas e as desigualdades são evidentes.
Deputada do PS e membro do Grupo Parlamentar Português sobre População e Desenvolvimento