O Neo-liberalismo é um difícil empecilho, por vezes, de entender, na medida em que os próprios defensores dessa doutrina têm vergonha em assumi-la publicamente (claro que alguns, na imprensa, o fazem com orgulho, porém é desprovido de responsabilidade política e só com interesse de exposição mediática). O que é compreensível. Quem é que no seu perfeito juízo vai dar o peito às balas, directamente, a uma ideia utópica de uma sociedade estendida aos parâmetros da lei do mais forte darwinista? É um bocado como ter um filho bastardo, até se pode gostar muito dele, no entanto perante a sociedade mais vale tratá-lo como tal.
No Documento de Estratégia Orçamental, contrariamente aquilo que foi referido anteriormente, o Governo reconhece, com todas as palavras, o seu rebento ilegítimo: “A privatização de empresas públicas continuará a ser um vetor estratégico no âmbito do processo de consolidação orçamental e de sustentabilidade das finanças públicas, pelo que o Governo prosseguirá a análise e identificação das entidades que reúnam condições para serem incluídas no programa de privatizações”. Além de que enumera as privatizações feitas como se fossem troféus de caça (EDP, REN, Caixa Saúde, Galp, ANA, CTT e Caixa Seguros, Águas de Portugal. A próxima é a TAP). Por outro lado, o Ministério das Finanças é representado como o coordenador de todos os planos orçamentais, quase como um corpo estranho fora do Estado, no entanto é provido de um carácter técnico e de influência política. No fundo é o primogénito da “Troika” em Portugal.
Não se esqueçam alguns principais indicadores das reformas estruturais, tendo em conta que transmitem contradições daquilo que tem sido a política real escolhida: Criação de um enquadramento legal favorável à criação de emprego (não é verdade. Nunca foi uma prioridade deste Governo); Promoção de um funcionamento eficiente do mercado, nomeadamente através de uma justiça célere e de uma regulação eficaz (qual regulação eficaz?); Redução de barreiras à dinamização da economia (mais um chavão para o encontro com o neo-liberalismo).
A saga continua com o esvaziamento da saúde, da área administrativa, da educação, justiça e energia. A redução dos custos com medicamentos e a renegociação com os privados é a bandeira hasteada bem lá no alto da área da saúde. Por outro lado, a administração pública foi emagrecida com o despedimento de funcionários públicos, a energia é a vitória da “liberalização do mercado da eletricidade e do gás natural” e a educação/ensino, enfim, longe do que foi.
Então este Governo é ou não neo-liberal? Sim, quase sempre. O quase é aquilo que nenhum neo-liberal tem legitimidade para o fazer, ou seja, exigir mais impostos. De facto, os neo-liberais têm uma aversão tão grande à taxação que mesmo quando taxam os contribuintes, bom, negam que o estão a fazer.