A praxe guilhotina a Universidade

Esta praxe mata a verdadeira Universidade.

Ora, a praxe, por excelência, e quase por definição, é a aniquilação de tudo isto. Onde nos humilhamos, humilhamos e somos humilhados. E, triste é, que nos humilhamos mais a nós quando o estamos a tentar fazer aos outros.

Os doutores e os pastranos e os duques e duquesas com “x” têm a oportunidade de ser a ponte dos jovens para a universidade, de lhes ensinar os valores do pensamento crítico, da humildade científica, o gosto pelo não. Ensinar-lhes que a beleza da ciência está em alguém de 20 dizer que alguém de 80 está errado; ter razão; e, no fim, o regozijo ser mútuo. O pensamento, a ciência e a academia são anárquicos. A desobediência racional é pedra basilar do saber.

Mas drogados pelo poder que lhes é emprestado, estes miúdos de capa promovem a iniciação dos caloiros à universidade através duma cultura hierárquica de submissão e obediência e de entorpecimento intelectual que é, em tudo, o cancro do real academismo.

O primeiro contacto que os jovens têm com o ensino superior é o da animalidade, da humilhação sadia e da estupidificação do intelecto. Aqui, na praxe, o caloiro não fala. Ouviu caloiro? Calado e cabeça no chão! E quando se dirigir a mim, tratar-me-á por excelentíssima pastrana! Ouviu caloiro? (Sim.) Não responda!

Eu reconheço, porque lá estive e vi, que muitas vezes a praxe não tem de ser, e não é, um local onde os jovens sofrem, na noção mais sentimental do termo. Não sofrem. Quem se dignar a apreciar o espetáculo que se tornou ser um aluno de faculdade neste país, verá o regozijo com que muitos jovens se sujam na farinha, na lama e no ovo podre ou como, mais obedientes que aos seus pais, acatam, felizes que nem cachorros, as ordens dos doutores que, à sua frente, lhes cospem na cara. Estes doutores vêm depois à televisão muito melindrados pois a comunicação social lhes está a retratar mal a profissão. Estão eles tão altruisticamente preocupados com a integração dos jovens, querem lá eles saber de usar o provável único momento da sua vida em que têm na mão o poder de humilhar umas dezenas de apáticos cordeiros, e a comunicação social a retratá-los assim. Não há direito.

A questão neste argumento não é distinguir má praxe de boa praxe. É distinguir praxe de Universidade. São conceitos antagónicos. Têm no seu núcleo, na sua construção aparelhística e, principalmente, naquilo que almejam, uma matriz diferente. Uma não é parte da outra, é contrária à outra. Não me interessa catalogar se isto ou aquilo é a verdadeira praxe. Interessa-me que esta praxe mata a verdadeira Universidade.

Estudante universitário

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