Agulha Inquieta: Bordar como forma de revolução

Carmo sabe bordar flores e passarinhos, mas é com bordados de intervenção que está a dar que falar.

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Agulha Inquieta

Como tantas outras meninas, Carmo aprendeu a bordar com a mãe. Tem na memória aquela imagem idílica das tardes de Verão passadas a bordar, refugiada do calor na frescura de casa. Mas ao crescer percebeu que não queria bordar passarinhos e flores a vida toda. Hoje borda preocupações, frustrações e opiniões, que publica numa página no Facebook. 

O P3 foi conhecê-la — e com ela veio Joel Faria e o seu bloco. No meio de risos surgiu uma conversa ilustrada sobre arte, bordados e formas de expressão. 

“Foi na manifestação do dia 2 de Março que tudo começou” lembra Carmo. “Estava uma menina na Avenida dos Aliados, com um megafone na mão a dizer “a austeridade tira-me a vontade, a exploração tira-me o tesão”. 

A entrevista através do traço de Joel Faria
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A entrevista através do traço de Joel Faria

O contraste entre a delicadeza da rapariga e a força das suas palavras foram as fontes de inspiração. “Fui atrás dela com a agenda e pedi para dizer a frase outra vez”, relembra, “ela perguntou o que ia fazer com aquilo, e eu respondi ‘vou bordar’”. 

E bordou. Essa frase e tantas outras, “como forma de libertação”. Afinal, “aquela coisa de fazer o paninho de tabuleiro para servir o cházinho” sempre lhe fez “confusão”. Os quadros foram sendo oferecidos aos amigos. Carmo ficou com as fotografias. E aos poucos a ideia da Agulha Inquieta foi ganhando forma.

Timidez e agulha na mão

“A página esteve mergulhada na minha timidez pessoal durante meses”, admite. Mas viu a luz do dia em pleno Teatro Rivoli, por ocasião do Master.Spitch. A iniciativa promove o Marketing Pessoal, e convida os participantes a promoverem os seus projectos em 90 segundos. 

Decidida a levar a sério os seus bordados, Carmo viu aí “uma oportunidade para a Agulha Inquieta sair da casca”. “Eu reconheço que tenho uma boa ideia, mas não sei como a pôr em prática. Nunca estudei gestão, nunca estudei marketing e isto está a ajudar-me a construir a estratégia para lá chegar”, conclui.

Bordado como forma de arte

O que Carmo quer é que a sua arte contribua uma dia para a sua subsistência. Isso e que seja reconhecida como qualquer outra forma de arte. No horizonte está a comercialização das peças e, de momento, uma exposição (num espaço que lhe é “muito querido”). 

A grande dificuldade prende-se mesmo com a sua generosidade: “A exposição só faz sentido se eu tiver material. E eu dou tudo o que faço, o que é um bocado idiota”, conclui. Por isso hoje em dia dedica-se a “criar material para montar a exposição”. 

O tempo que cada peça demora a estar pronta varia. Normalmente Carmo borda à noite, quando tem “mais tempo”. E de vez em quando, surgem temas que “exigem maior rapidez”. “Dormir deixe de ser prioridade”. 

Foi assim com o quadro que bordou em apoio ao artista Hazul: “Deitei-me às cinco da manhã para o ter pronto. E voltava a fazê-lo se fosse preciso”. Já diz o ditado que quem corre por gosto não cansa. E esta Agulha gosta muito do que faz. 

Os desenhos de Joel já estão prontos, e a nossa conversa chega ao fim. Mas ainda há tempo para que Carmo nos deixe um último conselho: “Bordai, senhores, bordai”. Ah, e se estão curiosos quanto ao seu nome completo, basta Dona Carmo, Faxabore.

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